Se perguntarem o que é o amor?


Tem pergunta cuja resposta sai de bate e pronto. Tem pergunta que exige alguma reflexão. Agora, tem pergunta que nem mesmo pensando e pensando, parece que a resposta nunca nos agrada. Para questões muito complexas, até conseguimos elaborar respostas aparentemente sólidas. Disse aparentemente porque, com o tempo, tais respostas se desmancham no ar. As respostas são as mesmas, nós é que estamos em permanente transformação.

Arlindo Cruz é um sambista carioca forjado nas rodas de samba do Cacique de Ramos, zona Norte do Rio de Janeiro, com Jorge Aragão, Beth Carvalho, Beto sem Braço, Ubirani e Almir Guineto. Zeca Pagodinho e Sombrinha também participavam. Arlindo compôs uma canção intrigante chamada ‘o que é o amor’ em parceria com Maurição e Fred Camacho. Essa canção foi gravada por Maria Rita no excelente CD ‘Samba meu’. Diz assim: 

“Se perguntarem o que o amor para mim, não sei responder, não sei explicar. Mas sei que o amor nasceu dentro de mim, me fez renascer, me fez despertar. Me disseram uma vez que o danado do amor pode ser fatal, dor sem ter remédio para curar. Me disseram também que o amor faz bem e que vence o mal. E até hoje ninguém conseguiu definir o que é o amor (...)”

Na língua portuguesa, a palavra amor presta-se a vários significados: afeição, compaixão, misericórdia, ou ainda, inclinação, atração, apetite, paixão, querer bem, satisfação, conquista, desejo, libido. O conceito mais popular de amor envolve a formação de um vínculo emocional com alguém que seja capaz de receber este comportamento amoroso e enviar os estímulos sensoriais e psicológicos necessários para a sua manutenção e motivação. Fala-se do amor de muitas formas. Amar também tem o sentido de gostar muito.

Para Adélia Prado, o amor é a vitalidade. Diz a poetiza mineira nascida em 1935 que quando se ama uma pessoa, tem lugar para tudo menos para o tédio. Essa vitalidade amacia os sentimentos e os pensamentos. No contato, o corpo vai se transformando em leveza. A saliva do beijo sacia a sede do/a outro/a como o vinho que derruba as máscaras e expõe os olhos e a alma. O encontro transforma tensão em riso. ‘In Vino Veritas’ diziam os antigos romanos, ou seja, no vinho está a verdade. Na embriaguez, a língua fica mais solta e a verdade vem à tona. Vinho e amor têm capacidades transcendentes. Amantes estão despidos de preconceitos e de pudores. Amantes estão vestidos de amores.

Na conclusão de sua canção, Arlindo Cruz associa a chama do seu amor ao brilho do sol. “Quando a gente ama, brilha mais que o sol. É muita luz, é emoção o amor. Quando a gente ama, é o clarão do luar(...)”. O sol é uma estrela, um corpo celeste que produz e emite energia pelo espaço devido à fusão nuclear. Parte dessa energia eletromagnética é luz.

Para o gaúcho Mario Quintana (1906-1994), “bom mesmo é morrer de amor e continuar vivendo.” O poeta conseguiu acomodar um pouco essa nossa breve reflexão sobre o amor. Afinal, tem pergunta que a vida toda é insuficiente para responder. Pensando bem, existiriam respostas absolutas para determinadas perguntas? Provavelmente não. Sobre as indagações, conclui Quintana: ‘A resposta certa, não importa nada: o essencial é que as perguntas estejam certas’.

Permita-se viver as emoções. Escolha a boa trilha, vinho tinto seco e poesia.














Naquela mesa está faltando ele. Para Juarez Araújo Braga

Jacob do Bandolim é um importante artista brasileiro. Carioca nascido em 1918 trabalhou como arquivista no Ministério da Guerra, serventuário na justiça do Rio de Janeiro e escrivão na capital carioca. Contribuiu com cultura brasileira, em particular ao choro.
O Choro, ou chorinho, é um gênero musical, uma música popular e instrumental brasileira com mais de 130 anos. Considerada primeira música popular urbana típica do Brasil, é de difícil execução. Quem faz choro é chorão. Chiquinha Gonzaga era chorona. ‘Carinhoso’ é um choro de Pixinguinha. ‘Tico-tico no Fubá’ é de Zequinha de Abreu, ‘Brasileirinho’ de Waldir Azevedo. Heitor Villa-Lobos também chorava.
Jacob do Bandolim faleceu em 1968. Seu filho, Sérgio Bittencourt, compositor e jornalista, criado em rodas de choro, apesar da escrita dura e desaforada era considerado sentimentalista. Abalado com a morte do pai, compôs ‘Naquela mesa’: “Naquela mesa ele sentava sempre e me dizia sempre, o que é viver melhor. Naquela mesa ele contava histórias, que hoje na memória eu guardo e sei de cor. Naquela mesa ele juntava gente e contava contente o que fez de manhã. E nos seus olhos era tanto brilho, que mais que seu filho, eu fiquei seu fã (...)”
Recentemente perdemos Juarez de Araújo Braga. Ele completaria 80 anos em 26 de novembro. Sinto uma falta danada do professor Juarez, das conversas intermináveis, do seu otimismo e da sua energia. Do alto da sua sabedoria, alimentava todos/as à sua volta com energias fundamentais para luta. Ele próprio era a representação concreta de uma vida dedicada à construção de um mundo melhor.
A paciência e a calma do Juarez, a visão de que a vida é processo e a forma sempre tranquila como tratava questões complexas, referenciaram muita gente. Desde 2005 viveu intensamente o processo de democratização da gestão nas escolas da rede municipal de Suzano. Seu envolvimento com o tema era tamanho que a aprovação da Lei que dispõe sobre a criação dos conselhos de escola levou aquele homem de 75 anos às lágrimas. Acreditava cegamente na democracia em todos os espaços da sociedade.
Juarez acolhia com respeito. Do jeito dele, chamando para uma conversa, para um vinho, para uma baladinha, como ele lançava seu convite. Dispunha de conhecimento teórico e filosófico, mas preferia usar do carinho e da tolerância para ensinar, característica de um homem sábio e de um enorme ser humano.
Diziam que eu levava o Juarez para o ‘mau caminho’. Discordo: trilhávamos caminhos da música, da cultura, da filosofia, da política e da democracia. Aprendi com ele, em diálogos às mesas que ele convidava, vivendo momentos de especial sabedoria.
Tinha gosto musical refinado. ‘Canto das 3 raças’, de Paulo César Pinheiro e Mauro Duarte, na voz da Clara Nunes, ‘o mundo é um moinho’ de Cartola. Ao som de Ataulfo Alves, falava com saudade da professorinha.
‘Naquela mesa’ termina assim: “Eu não sabia que doía tanto uma mesa no canto, uma casa e um jardim. Se eu soubesse quanto dói a vida, essa dor tão doída, não doia assim. Agora resta uma mesa na sala e hoje ninguém mais fala no seu bandolim. Naquela mesa tá faltando ele e a saudade dele tá doendo em mim’.
As mesas estão vazias, a alegria está triste. Quando dói uma saudade, o coração aperta e a voz embarga, basta lembrar do Juarez na celebração da vida. É hora de outro chorinho.

Adoro canções infantis

Chega o final de ano, as festas que confraternizam, movimentam o comércio e a indústria. A indústria fonográfica e seus interesses comerciais, prepara grupos que vão fazer sucesso, estarão nos programas de TV, venderão milhões de cópias. Seremos violentados com canções de qualidade duvidosa, que pouco contribuem para a melhoria dos sujeitos e a transformação da sociedade.

Recentemente comprei um CD infantil para a filha de um amigo. Com canções de Vinícius de Moraes, Toquinho, Chico Buarque e outros, o belo CD chama-se “pra gente miúda” volume I, gravado em 1985. Elis Regina, Ney Matogrosso, Moraes Moreira, MPB4, Chico Buarque, Lucinha Lins e os Trapalhões entre outros, interpretam as canções. Sim, os trapalhões na sua formação original com Didi, Dedé, Mussum e Zacarias visto que a trilha sonora do filme ‘os saltimbancos trapalhões’ constitui-se de versões do musical infantil de Sérgio Bardotti, Luis Enríquez Bacalov e Chico Buarque de Hollanda.

A pequenina está crescendo, dominando os movimentos, dominando a fala e ampliando seu vocabulário. Apesar dos noventa e poucos centímetros, ocupa todo o espaço aonde chega com sua alegria e vitalidade. Captura olhares e atenções, nunca passa despercebida. É uma graça de criança, puxou o pai. Tem lindos olhos claros, puxou a mãe. É uma menina sapeca e encantadora, filha de ambos.

Em Suzano, o diálogo entre Educação e Cultura tem mostrado resultados muito interessantes. São projetos que possibilitam acessar o conhecimento elaborado pela humanidade e que está registrado nos livros e na forma de arte. Um(a) sujeito(a) é resultado daquilo que lê, que escuta, que vê, que vive. Você certamente já se sentiu extasiado diante de uma linda paisagem, diante de um arco iris que contrasta seu espectro de cores com o fundo azul do céu e o branco das nuvens, diante de um por de sol que tinge o céu com a cor do fogo, uma tela deslumbrante ou um filme maravilhoso. Uma bela canção, uma bela poesia permitem tantas leituras quantas nossos olhos forem capazes de enxergar.

Canções são canções. Partem de uma inspiração, passam por um processo criativo e nunca estão concluídas. Até estão acabadas quando registradas no vinil, no CD ou outros formatos. Mas concluídas nunca estão, pois seu criador também é um ser inconcluso. O ser humano é inconcluso, sua obra é inacabada.

Adoro canções infantis.



publicado no jornal sete
página 6

http://www.jornalsete.com.br/pdf/jornal138.pdf

é só pensar em você



Tem canções que são obras de arte. Alguns compositores são capazes de eternizar poesia em melodia. Muita gente conhece Chico César na canção ‘mama África’. Eu prefiro a canção ‘mulher eu sei’ em que ele aliou o feminino e o masculino numa composição.

Francisco César Gonçalves nasceu em Catolé do Rocha, cidade do interior na Paraíba, em janeiro de 1964. Aos 16 anos foi para João Pessoa onde estudou jornalismo na Universidade Federal da Paraíba. Aos 21, mudou-se para São Paulo onde trabalhou como jornalista e revisor de textos ao mesmo tempo em que multiplicou suas composições e formou seu próprio público. Sua poética é de encanto lingüístico.

A temática do amor é muito forte na obra de Chico César. O amor quando acontece, invade sem pedir licença e torna a pessoa amada presente com força e sutileza. A linda canção ‘onde estará o meu amor’, conhecida na voz de Maria Bethânia, diz assim: “como esta noite findará e o sol então rebrilhará, estou pensando em você. Onde estará o meu amor? Será que vela como eu, será que chama como eu, será que pergunta por mim? Se a voz da noite responder, onde estou eu onde está você, que estamos cá dentro de nós, sós. Se a voz da noite silenciar, raio de sol vai me levar, raio de sol vai me trazer. Onde estará o meu amor?”

A noite finda, o sol brilha. Vela ou chama, imortal e infinito. Um amor que transcende tempo e espaço. Amor invasivo, absoluto. Ou apenas amor, simples e singelo. O artista fala de um amor permanente, faça chuva ou faça sol. Passa o tempo, passa a vida, ama e é amado. Na língua portuguesa, a palavra amor pode significar afeição, atração, apetite, paixão, querer bem, conquista, desejo, libido e etc. Seu conceito mais popular envolve a formação de um vínculo emocional com alguém que seja capaz de receber este comportamento amoroso e enviar os estímulos sensoriais e psicológicos necessários para sua manutenção e motivação.

Em parceria com Vanessa Bumagny, a canção ‘pétala por pétala’ fala de um amor descoberto na ausência. É linda: a sua falta me fez ver / o que de mau a vida pode ter / e a sua volta me dá mais / de todo o mel que eu ousaria querer. Sua presença me faz rir / dos dias feitos pra chover / não há revolta pra sentir / nem há milagre pra não crer. Vinda que finda / a tinta de pintar tristeza / deixa os mistérios plenos de sentido / e a flor da vida toda. Pétala por pétala / que um tolo pode colher / sem saber que é amor. Vem e aumenta em mim / o único que sou / me subtrai do que em mim passou / é amor, vem...

Nesta letra, o artista sugere que o amor independe das convenções, independe da presença. Ele é e pronto. Na ausência ele se recolhe, na presença o amor se expande. Amor, nas suas mais diferentes manifestações, é uma das expressões mais belas da espécie humana.

Por meio da Secretaria Municipal de Cultura, a Prefeitura de Suzano trouxe esse lirismo romântico no último domingo (21). Chico César apresentou-se no Pavilhão Zumbi dos Palmares que fica no parque Max Feffer cujo espetáculo integrou a programação da consciência negra. Muito apropriado por sinal.

Finalizo com linda ‘pensar em você’: é só pensar em você que muda o dia / minha alegria dá pra ver / não dá pra esconder / nem quero pensar se é certo querer / o que vou lhe dizer: um beijo seu e eu / vou só pensar em você / se a chuva cai e o sol não sai / penso em você / vontade de viver mais / e em paz com o mundo / e comigo (e consigo).


 

Presidenta ou Presidente?

Eleição é momento importante. Momento de escolher nossos/as representantes para os espaços institucionais. Quem, dentre nós, assumirá, em nosso nome, a responsabilidade de conduzir durante os próximos quatro anos o Governo do Estado e a Presidência da República. E também quem nos representará no Senado Federal, na Câmara dos Deputados e na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.

Presidenta ou presidente? Eis a questão. Uma breve pesquisa me ajudou a recuperar conteúdos da gramática da língua portuguesa.

Presidente é substantivo. Substantivo é tudo o que nomeia as ‘coisas’ em geral. Substantivo é tudo o que pode ser visto, pego ou sentido. Os substantivos podem ser classificados em comum, próprio, concreto ou abstrato. Substantivo comum é aquele que designa os seres de uma espécie de forma genérica. Picolé e chuchu são comuns. Substantivo próprio é aquele que designa um ser específico, determinado. Normalmente iniciam com letra maiúscula como Candido, Filippi, Marta, Neto, Aloízio e Dilma. Substantivo concreto é aquele que designa seres que existem por si só, mesmo que apenas na imaginação. Ar e som são substantivos concretos. Já o substantivo abstrato é aquele que designa prática de ações verbais, existência de qualidades ou sentimentos humanos como ‘candura’.

Quanto ao gênero, masculino ou feminino, os substantivos são classificados em biforme, com duas formas para o mesmo radical como menina e menino. Heterônimos, com duas formas e dois radicais como mulher e homem. E uniforme quando apresentam apenas uma forma para os dois gêneros. Dentre eles, a categoria ‘comum de dois’ quando a mesma forma para os dois gêneros com alteração do artigo. A presidente, o presidente.

Com a breve pesquisa, cheguei às seguintes conclusões.
1) presidente é substantivo;
2) a gramática da língua portuguesa indica que a forma correta é ‘a presidente’ ou ‘o presidente’;
3) o povo brasileiro indica, segundo todas as pesquisas de opinião, a opção por ‘a presidente’.

É substantivo e é concreto: a voz de Deus é a voz do povo.


Publicado no jornal SETE, página 6.

Eleições 2010 - parte II

Eleições 2010 - Parte II


No dia 3 de outubro o povo brasileiro vai às urnas. O período de campanha eleitoral serve, entre outras coisas, para garantir a eleitores/as um cardápio de possibilidades, ou seja, chapas de candidatos/as que representarão esses mesmos eleitores/as nos espaços institucionais se eleitos, e um conjunto de informações sobre esses candidatos de forma que eu, você, o eleitorado de modo geral possa escolher seu/sua representante.

Aproveite bem o período de campanha eleitoral. É importante pesquisar bem para decidir em quem confiar o voto. Um aspecto importante que deve ser bem analisado é a biografia do/a candidato/a, tanto do ponto de vista da sua vida pública, da sua trajetória política e eleitoral quanto traços da composição do seu caráter como honestidade, idoneidade, sua capacidade de diálogo com a base eleitoral, entre outras. Isso é importante visto que vivemos numa democracia representativa, o que quer dizer que o/a eleito/a representará milhares de eleitores/as, ocupará em nosso nome um importante espaço de poder político. Veja também os materiais de campanha, veja o programa eleitoral, pesquise a biografia dos/as candidatos/as, quais compromissos políticos assume, que grupos de interesse representa. Não caia em conversinha fiada e não acredite em propostas vazias.

Se o candidato cumprir os requisitos que você julga essenciais para merecer sua confiança, sua decisão já está bem encaminhada. Tem uma ideia sempre utilizada nas eleições com maior insistência nos candidatos conservadores, que é estimular o eleitorado a votar em candidatos ‘da cidade’. Esse critério não é importante para mim. São 94 deputados estaduais num universo de 645 municípios. São 513 deputados federais para 5.565 municípios. Na democracia representativa alguém é eleito/a para representar um povo. Não existe um/a presidente, um/a governador/a, de parcela da população. Se é presidente do país, se é governador/a do estado e, no exercício do cargo deve-se estabelecer prioridades, ou seja, o que é mais importante dentre as coisas importantes. Entre os parlamentares, deputados estaduais ou federais e senadores, o princípio é o mesmo. É evidente que os compromissos políticos maiores são com sua base eleitoral, com os grupos de interesse que ele representa, com os vínculos que o/a eleito/a tem com sua base social.  Afinal, o que está em jogo e deve ser defendido (todo momento) é o interesse público, a democracia como princípio fundamental. Então, se o candidato for honesto, tiver uma boa biografia, se posicionar diante dos temas polêmicos de forma parecida com as suas convicções, eleitor/a, você está num bom caminho. Se estiver vinculado a um partido político, ou seja, a uma parcela da sociedade que se organiza num partido cujos princípios filosóficos expressos na sua carta de princípios e nos seus documentos principais, no seu estatuto inclusive, melhor ainda. E se, depois de preenchidos todos esses requisitos ainda for da sua cidade, aí sim.

As informações estão aí. Seja crítico, questione, tire suas dúvidas. Exija compromissos públicos. Converse sobre isso, reflita. Esse é o jeito de exigir mais qualidade dos/as candidatos/as. Afinal, os resultados dessa escolha serão sentidos por todos nós durante os quatro anos do mandato, oito no caso do senado. E, durante o mandato, participe também, organize reuniões de prestação de contas, acompanhe o trabalho do/a eleito/a pela internet e por publicações que os mandatos organizam, embora isso ainda não seja regra.

O período eleitoral é um momento importante na democracia brasileira. Participe.


Para inglês ver e paulistano não participar

Dia desses recebi o telefonema de uma amiga inconformada com a notícia que acabara de ouvir no rádio do carro, enquanto lutava contra o trânsito paulistano. E ela estava bem alterada!

Enquanto receptor da mensagem, fiquei pensando que o engarrafamento deveria ser absurdo, o que não é novidade em se tratando da cidade de São Paulo. Talvez o ocaso de um dia daqueles em que tudo dá errado justificasse tamanha irritação. Antes de qualquer conclusão precipitada, decidi ouvir seu desabafo. Na briga com a instabilidade da operadora que a todo momento derrubava a nossa ligação, entrei no site da rádio para recuperar a notícia e entender melhor o que estava acontecendo. Ao ler a matéria, fui tomado por um misto de indignação, irritação e inconformismo.

Conforme a notícia, a prefeitura convocou 31 audiências públicas para discutir com a população as prioridades para o Município de São Paulo. Falou também da polêmica causada na Câmara Municipal entre a base de sustentação do governo municipal e a bancada de oposição. A oposição defende a realização de audiências não apenas em um dia, mas num período de trinta dias. O líder do governo na câmara não abre mão do método estabelecido, alegando que um calendário muito longo ameaça a confecção da proposta orçamentária. 

O fato é que cada subprefeitura sediará uma audiência numa única noite. Na minha imensa ignorância, fiquei pensando que poderia haver algum engano na informação por se tratar do terceiro maior orçamento público do país, volume de recurso superior a todos os estados da federação, exceto do estado de São Paulo e da União.

Para se ter uma noção do que isso quer dizer, estima-se aproximadamente 11 milhões de paulistanos distribuídos nos 1.523 quilômetros e um orçamento municipal da ordem dos R$ 30 bilhões. Esse recurso deve ser utilizado para financiar as políticas de saúde, de educação, cultura, esportes, políticas sociais e tantas outras áreas fundamentais para atender àqueles que têm apenas o poder público para recorrer em suas necessidades, para garantir os direitos de homens e mulheres, de adultos, idosos e crianças, para reduzir as imensas desigualdades sociais na cidade - melhor alternativa para enfrentar e superar os índices de violência urbana. Uma cidade cosmopolita, maravilhosa pela sua diversidade cultural, pelo carinho com que recebe migrantes e visitantes, um microcosmo do que é esse país fantástico chamado Brasil. Logo, o orçamento público municipal ou a Lei do Orçamento Anual, como queira, é assunto essencial.

Fui ao sítio da prefeitura de São Paulo na esperança de encontrar algo que me despertasse desse pesadelo. Doce ilusão. Por meio de edital, o secretário das Subprefeituras “CONVOCA todos os cidadãos residentes no Município de São Paulo e associações representativas com sede no município a participarem das AUDIÊNCIAS PÚBLICAS para discussão da proposta orçamentária para o exercício financeiro de 2011...”.

Toda metodologia está definida. Basta apresentar o documento de identificação pessoal, endereço e telefone para participar da audiência. Também define o objetivo das audiências públicas: “disseminação das informações sobre as políticas publicas, apresentação de sugestões e discussão das propostas, visando a subsidiar a proposta orçamentária do Município de São Paulo para o exercício financeiro de 2011”.

Por fim, a cereja que decora o bolo: “pedidos de informações ou esclarecimento sobre programas orçamentários poderão ser encaminhados ao subprefeito competente até 3 (três) dias antes da realização da audiência pública em que serão debatidos. Pior que um pesadelo, estava diante de um filme de terror escrito, dirigido e encenado pelo governo democrata a frente da prefeitura de São Paulo. E nem ficam vermelhos de vergonha quando convidam, ou melhor, “convocam” a população paulistana para protagonizar uma tragédia com verniz de comédia. 

Nos governos do PT e partidos do campo democrático e popular, a metodologia adotada para a discussão do orçamento público é a do OP - Orçamento Participativo. 

Experiência exitosa, premiada internacionalmente, atualmente desperta interesse principalmente dos países europeus. O que nos levou à necessidade de criar a Rede Brasileira de OPs, com sede na cidade de Guarulhos, para organizar melhor as informações nos municípios brasileiros e facilitar o diálogo com o exterior.

Recentemente, recebemos a visita de um estudante da Universidade de Birmingham, no Reino Unido. O pesquisador esteve em Suzano, Rio Claro e Várzea Paulista, para conhecer de perto e em detalhes a experiência de OP, que é parte de seu estudo acadêmico, cujo projeto foi agraciado com bolsas de pesquisa e prêmios naquele país.

No OP de Suzano, a população é convidada a participar das plenárias que acontecem durante aproximadamente dois meses em locais e horários acessíveis à maioria das pessoas. Antes das plenárias, são realizadas inúmeras reuniões preparatórias nas escolas, nas associações de moradores, nas unidades de saúde, nas igrejas, nos bares, enfim, onde e quando a população solicitar. Esse momento é importante no sentido de transmitir as informações, ajudar as pessoas a se organizarem e, assim, participarem efetivamente da plenária regional deliberativa. 

É garantido o acesso e a permanência dos moradores e moradoras, com a ‘Ciranda do OP’, espaço lúdico onde as crianças participam da plenária sob cuidados de educadores. Há eleição direta para conselheiros e conselheiras do orçamento participativo, que em Suzano se chama CORPO. E utilizamos a caravana do OP, para proporcionar um melhor conhecimento da cidade. É organizada uma agenda de reuniões onde se encontram o CORPO e os diversos setores do governo municipal, incluindo secretários/as, até definir o plano de investimento. Em suma, as prioridades que integram o plano de investimentos municipal, do exercício financeiro do ano seguinte, é resultado do debate do Conselho do OP, representado por 2/3 da população e 1/3 do governo.

Voltando ao processo reduzido e demagógico desencadeado pela Prefeitura de São Paulo, quero fazer algumas considerações. Em caso de dúvida, envie ofício em 4 vias carimbadas, autenticadas, protocoladas 3 dias antes, aguarde o subprefeito responder para você, viu? Espere sentado. A expressão ‘audiência’ deriva da palavra audição: “ato de ouvir, escutar”. É isso que o governo paulistano fará. 

Seus agentes de governo vão dedicar algumas horinhas do seu precioso tempo durante um dia do ano para fazer um imenso favor, ouvir a população. Tem uma expressão portuguesa que diz: “para palavras loucas ouvidos moucos”. Eles fazem ouvidos moucos para quem está louco para contribuir de fato, para tornar cada vez melhor a cidade onde vive. Um processo burocrático, realizado apenas para cumprir algum dispositivo legal, que exige a realização de audiência pública. Daí a dizer que a população vai participar efetivamente das decisões, influenciá-las que seja, é piada.

Nos municípios que adotam o OP, a população é protagonista das decisões e dos seus destinos. No caso das audiências públicas, convocadas pelo governo municipal de São Paulo, a população terá papel secundário, como tem assumido figuração nas tantas comédias e tragédias encenadas como parte do projeto político dos demotucanos ao longo dos últimos anos. Tragédias e comédias podem ser muito boas. No caso do ocorrido em São Paulo, trata-se de uma piada de péssimo gosto.

Compreendi a revolta da minha amiga. Mas fiquem tranquilos, pois basta olhar os resultados eleitorais, inclusive o que virá ainda esse ano, e perceber que o projeto demotucano definha.


Publicado no sitio do PT São Paulo


QUEM TEM MEDO DA DEMOCRACIA


 

Eleições 2010

Eleições 2010 - Parte I


Vivemos tempos de eleições. Em outubro, diante da urna eletrônica, o povo brasileiro escolherá Presidente da República, Governador/a nos 27 estados da federação, Senadores/as, Deputados/as Federais e Deputados/as Estaduais. Bem, para colaborar com os/as (e)leitores/as, vamos colocar o processo de votação na ordem correta.

Primeiro vamos votar no/a Deputado/a Estadual. Cada um de nós escolherá um representante, mas no total serão eleitos 94 deputados à Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.

O segundo voto será para Deputado Federal. Nesse caso, cada um escolhe um/a representante, mas a Câmara Federal é composta por 513 deputados que representam os interesses do povo do seu estado. Então, o eleitorado paulista será representado por setenta deputados, o limite máximo segundo a legislação, compondo a maior bancada. O limite mínimo são oito deputados representando a população dos estados de menor eleitorado como o Acre por exemplo.

No Senado Federal, diferente da Câmara dos Deputados, a representação é federativa, ou seja, cada Senadora ou Senador representa seu estado. Por isso, são três representantes para cada um dos vinte e seis Estados e do Distrito Federal totalizando 81 senadoras/es. Apenas no Senado o mandato é de oito anos, mas a renovação de quatro em quatro anos alternadamente. Ou seja, em 2006 elegemos o Senador Eduardo Suplicy, e agora em 2010 elegeremos dois. O terceiro e o quarto voto serão para Senadora e Senador.

O quinto voto será para Governador do estado de São Paulo.

E o sexto voto será para escolher Presidente da República.

Seis votos no total. Se considerarmos a quantidade de dígitos por votação mais os ‘confirma’, serão vinte e cinco toques na urna eletrônica, número que pode aumentar em caso de correção ou diminuir se a opção for votar na legenda, por exemplo. Uma dica: anote numa ‘colinha’ os números dos/as candidatos/as e carregue com você.

Bem, mas isso será no dia 3 de outubro. Até lá, é importante pesquisar bem para decidir em quem confiar o voto. Um aspecto importante que deve ser bem analisado é a biografia do/a candidato/a, tanto do ponto de vista da sua vida pública, da sua trajetória política e eleitoral quanto da composição do seu caráter como honestidade, idoneidade, e também sua capacidade de diálogo com a base eleitoral. Isso é importante visto que vivemos numa democracia representativa, o que quer dizer que o/a eleito/a representará milhares de eleitores/as no espaço institucional, ocupará em nosso nome um importante espaço de poder político. Veja também os materiais de campanha, veja o programa eleitoral, pesquise a biografia dos/as candidatos/as, quais compromissos políticos assume, que grupos de interesse representa. Não caia em conversinha fiada e não acredite em propostas vazias.

As informações estão aí. Seja crítico, questione, tire suas dúvidas. Exija compromissos públicos. Converse sobre isso, reflita. Esse é o jeito de exigir mais qualidade dos/as candidatos/as. Afinal, os resultados dessa escolha serão sentidos por todos nós durante os quatro anos do mandato, oito no caso do senado. E, durante o mandato, participe também, organize reuniões de prestação de contas, acompanhe o trabalho do/a eleito/a pela internet e por publicações que os mandatos organizam, embora isso ainda não seja regra.

O período eleitoral é um momento importante na democracia brasileira. Participe.




O sabor das descobertas

Mais um lanche de pão com presunto, queijo, alface e tomate. O tempo passa, a fome aumenta, qualquer alteração no cardápio tornaria a refeição infinitamente melhor. A qualidade das refeições servidas a bordo cai proporcionalmente ao aumento da fome. Longe de sugerir às companhias aéreas servir feijoada aos passageiros durante o trajeto por imaginar o efeito da turbulência. Pedro e Giovanna saíram da casa pela manhã e, com a ajuda da tecnologia que encurta as distâncias, horas depois estavam em Santiago, capital do Chile.
Ainda no aeroporto de Buenos Aires, diante da camisa da seleção Argentina, a pergunta: “em liquidación?” Nesse clima pós-copa do mundo a ideia genial de assinar os recibos com ‘Pelé’. Dizem que choveu no deserto de Atacama e a natureza explodiu em vegetação. O pulsar da vida na sua dimensão maravilhosa de flores, das cores e dos odores. Boato.
Os primeiros raios de sol permitem observar um imenso paredão de rochas com os picos pintados de branco e um brilho amarelado que, à medida do raiar do dia, menos doura, mais embranquece. Parece três vezes maior que a imagem mental da serra do mar vista das praias brasileiras. Os dobramentos modernos são estruturas formadas por rochas magmáticas e sedimentares pouco resistentes que foram afetadas por forças tectônicas durante o período Terciário provocando o enrugamento e originando as cadeias montanhosas. Estavam diante da Cordilheira dos Andes e algumas das maiores elevações da superfície da terra.
As águas frias do oceano Pacífico serão a próxima. Abraçada por 42 morros, Valparaíso é patrimônio cultural da humanidade, é sede do Poder Legislativo da República do Chile e foi em princípio habitada por índigenas, exímios pescadores que deram ínicio a principal atividade econômica local. Em La Sebastiana morou Pablo Neruda, um marxista que foi diplomata, político e Prêmio Nobel de Literatura com sua poesia. Uma casa nem muito alta nem muito baixa. Solitária mas não em excesso. Com vizinhos invisíveis que não olham nem escutam. Original, mas não incômoda. Nem muito grande nem muito pequena. Como o próprio Neruda queria. Foi contemporâneo de Salvador Allende e esteve no Brasil participando no estádio do Pacaembu da homenagem a Luis Carlos Prestes. E a fez lendo, para mais de cem mil pessoas, suas poesias.
Sair desta cidade portuária e observar os contrastes com a luxuosa Viña Del Mar, a cidade jardim, remeteu a cenas familiares: o simples e o luxuoso, o necessário e o supérfluo.
A experiência seguinte aconteceu 2 mil metros acima. Após 62 curvas e muitas paisagens, estavam na Cordilheira dos Andes, soberana testemunhando alarido que provocam em seus súditos. A diferença de pressão torna cada movimento mais estafante mas essa perfeita engrenagem de carne e osso, o corpo humano, se adapta às características do lugar.
O Chile, conhecido por seus vinhos maravilhosos e sua gastronomia rica em salmões e frutos do mar, redesenha sua imagem nas cabeças dos visitantes, inclusive eles, que saíram do Brasil para encontrar grandes contrastes em um vizinho tão próximo que surpreende pela diversidade cultural e ambiental.
Para nós brasileiros pode parecer loucura, mas para os chilenos é perfeitamente possível esquiar nos Andes e pegar uma praia no mesmo final de semana. E depois, comer mais um lanche de presunto cozido e voltar ao Brasil com muitas histórias para contar. Depois, é claro, de saborear as delícias da casa como o arroz com feijão, a carne moída e a salada.

Ivan Rubens Dário Jr e Pedro Picelli


Em Suzano, o povo tem voz e vez.

Quero, neste espaço, semear idéias e provocar reflexões e debates.

Penso que é importante tratar de temas como a democracia nas cidades por meio da participação popular, ou seja, que a população participe efetivamente na formulação das políticas públicas, no acompanhamento de sua execução, via de regra, por parte do poder executivo municipal, na fiscalização do uso dos recursos públicos. Enfim, no esforço permanente e cotidiano de ampliar a democracia como forma de contribuir para uma sociedade justa.

Falo com os pés em Suzano que, desde 2005, vive uma experiência rica. Aqui, participação popular é compromisso político expresso no programa de governo e sempre renovado pelo prefeito Marcelo Candido. Orçamento Participativo, inúmeras conferências municipais, conselhos trabalhando com autonomia e estrutura, acesso ao conhecimento técnica na área de atuação e formação política para ajudar conselheiro e conselheira a compreender a responsabilidade que é representar seus semelhantes. Por exemplo, o conselheiro de educação que representa o segmento dos pais/mães de aluno da rede municipal, fala por aproximadamente 24.000 famílias. Muita responsabilidade, não acham?

E vejam que, ao falar de escolas e unidades de saúde, são aproximadamente 100 equipamentos públicos que debatem seu dia a dia buscando melhorar a qualidade do serviço público nos quatro cantos da cidade identificando os problemas e construindo coletivamente, governo e população, as soluções para tornar a vida na cidade sempre melhor para todos os seus habitantes. Ou seja, fazendo a boa política visto que o foco é o interesse público, não o interesse individual.

Já pensou que, sendo morador de Suzano a pessoa pode participar de uma grande plenária e dizer para todos os presentes, inclusive ao prefeito e sua equipe, suas opiniões sobre a cidade e o lugar onde mora. E não é só isso não: basta ser morador do bairro para propor soluções, colocar sua proposta ali, ao vivo. É claro que com muita gente reunida, a plenária tem que ser bem organizada. A maioria define as prioridades para o trabalho da prefeitura naquele conjunto de bairros. Você não acha isso muito interessante?

Aqui em Suzano o povo tem voz e vez. E olhe que até 2005 os governantes não davam a menor bola para as opiniões do povo.

E, cuidado porque o defunto quer sair da catacumba

Tempo de escolhas

Vivemos tempos de eleições. Em outubro, diante da urna eletrônica, o povo brasileiro escolherá Presidente da República, Governador/a nos 27 estados da federação, Senadores/as, Deputados/as Federais e Deputados/as Estaduais. Bem, para colaborar com os/as (e)leitores/as, vamos colocar o processo de votação na ordem correta:

Primeiro vamos votar no/a Deputado/a Estadual. Cada um de nós escolherá um representante, mas no total serão eleitos 94 deputados à Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.

O segundo voto será para Deputado Federal. Nesse caso, cada um escolhe um/a representante, mas a Câmara Federal é composta por 513 deputados que representam os interesses do povo do seu estado. Então, o eleitorado paulista será representado por 70 deputados, o limite máximo segundo a legislação, compondo a maior bancada. O limite mínimo são 8 deputados representando a população dos estados de menor eleitorado como o Acre por exemplo.

No Senado Federal, diferente da Câmara dos Deputados, a representação é federativa, ou seja, cada Senadora ou Senador representa seu estado. Por isso, são três representantes para cada um dos vinte e seis Estados e do Distrito Federal totalizando 81 senadoras/es. Apenas no Senado o mandato é de oito anos, mas a renovação de quatro em quatro anos alternadamente. Ou seja, em 2006 elegemos o Senador Eduardo Suplicy, e agora em 2010 elegeremos dois. O terceiro e o quarto voto serão para Senadora e Senador.

O quinto voto será para Governador do estado de São Paulo.

E o sexto voto será para escolher a Presidente da República.

Seis votos no total. Se considerarmos a quantidade de dígitos por votação mais os ‘confirma’, serão vinte e cinco toques na urna eletrônica, número que pode aumentar em caso de correção ou diminuir se a opção for votar na legenda, por exemplo.

Mas isso será no dia 3 de outubro. Até lá, é importante pesquisar bem para decidir em quem confiar o voto. Veja os materiais de campanha, veja o programa eleitoral, pesquise a biografia dos candidatos, quais compromissos políticos assume, que grupos de interesse representa. As informações estão aí. Seja crítico, questione, tire suas dúvidas. Exija compromissos públicos. Converse sobre isso, reflita. Esse é o jeito de exigir mais qualidade dos/as candidatos/as. Afinal, os resultados disso serão sentidos por todos nós durante os 4 (ou 8) anos do mandato.


Manga tem sabor de infância

A manga é o fruto da mangueira. Originária da Índia, chegou ao Brasil trazida pelos colonizadores. Árvore de porte elevado em seu estágio selvagem, copa frondosa e sombra convidativa. No prefácio de À sombra desta mangueira, Paulo Freire conta que as árvores sempre o atraíram, inclusive os pássaros multicores e cantadores que nelas repousam. “O título deste livro é uma licença que me permito e com a qual sublinho a importância que teve na minha infância a sobra de diferentes árvores. (...) Sombra e luz, céu azul, horizonte fundo e amplo dizem de mim. Sem eles apenas sobrevivo, menos que existo. Minha biblioteca de adulto tem algo disso. Às vezes, é como se fosse a sombra da mangueira da minha infância.”

Pode ser a árvore da família das anacardiáceas (Mangifera indica), de origem asiática, de flores pequeninas e ordenadas em tirsos, e cujo fruto é uma drupa carnosa e saborosa, do qual há numerosas variedades. Manga e mangueira podem ainda ser tantas outras coisas.

Mangueira pode ser o tubo de borracha ou plástico para condução de água, ou ainda um grande curral. Manga pode ser uma parte da peça de vestuário, pode ser um grupo, ajuntamento, bando ou turma.

Para mim, a manga é sonora. Soa o calor dos trópicos, transpira e enche a boca d’água: “MAANNGA”. Quem já visitou o Museu da Língua Portuguesa sabe do que estou falando. Aproveite para passear no parque da Luz, na Pinacoteca do Estado e para observar o vai e vem frenético e cosmopolita que parte e chega à estação da Luz. E tem um piano à disposição da multiplicidade dos talentos populares e eruditos.

A manga pode ser bonita, cheirosa e adocicada. Manga verde com sal, saborosa quando amarela, sedutoramente vermelha quando bem madura. Descascar a manga com os dentes e comê-la com as mãos, escapando da boca e escorrendo manga pelo corpo. Os fiapos da manga no vão dos dentes? Nada que um fio dental não resolva. Suco de manga e geleia são delícias difíceis de descrever.

A manga pode ser divertida. Mangar significa caçoar, zombar. Tem sabor de quintal, de comer fruta no pé. Tem sabor de jabuticaba, por incrível que possa parecer, a manga tem sabor de outras frutas. Tem sabor de pitanga e até de laranja poncã.

A manga, danadinha, tem vida. Pelo menos as mangas das mangueiras do quintal dos meus tempos de menino. A manga brinca de esconde-esconde, joga futebol de golzinho, joga hóquei sobre patins, sem os patins é claro, nas traves de caixote de laranja que pegávamos na quitanda para jogar com os cabos de vassoura. Como pode uma criança crescer sem um quintal para brincar? O quintal da minha infância era interminável de tão grande. Ainda hoje sua imensidão cabe na memória deste adulto. Esse espaço para brincar chamado quintal, cujos limites físicos estabelecidos pelos muros não limitam as fantasias e a infância.

Mangueira pode ser, ainda, tradicional escola de samba carioca. O corpo docente é influente: Cartola, Carlos Cachaça, Jamelão, Nelson Sargento, dona Neuma, dona Zica e tantos/as mais. Mangueira, teu cenário é uma beleza. Intacto na memória o casarão da Rua 5 com Avenida 10, fresquinhas na lembrança as duas mangueiras, a jabuticabeira, as laranjeiras, as abelhas que enrolavam no cabelo. Os cães e gatos que durante muito tempo viveram em harmonia, assim como o pintinho que dividia a tigela de ração com a gatinha. Pode parecer história, e é. Histórias de tempos idos que trago no peito e na memória, assim como as brincadeiras e os amigos, as amigas, as alegrias e as fantasias que nunca morrerão e nunca crescerão. E como era grande o meu quintal. Já não dá mais para correr no quintal da minha infância. Ele continua do mesmo tamanho. Eu é que cresci. Portanto, o quintal da minha infância está bem menor. Já não comporta mais as intermináveis brincadeiras, as ilimitadas histórias, as irrealizáveis fantasias. Ou seja, proporcional às dimensões reduzidas das infâncias de um adulto.

Manga tem sabor de infância.

Ivan Rubens Dário Jr.

Publicado no Jornal Cidade de Rio Claro
Publicado no sítio do Jornal Cidade de Rio Claro

Agora eu era...

"Agora eu era o herói e o meu cavalo só falava inglês. A noiva do cowboy era você além das outras três. Eu enfrentava os batalhões, os alemães e seus canhões...". Sabe quando bate aquela vontade de descobrir uma coisa? Vontade que mobiliza, faz sonhar com maneiras de desvendar o mistério e saciar a curiosidade, vontade de vencer o desafio que se nos apresenta. Aproveitei o feriado e me lancei. Aceitei o desafio, remexi minhas coisas, tirei os livros da prateleira, selecionei CDs para ouvir novamente. Até que se desenhou um caminho.

Encontrei num dos documentários sobre a vida e a obra do Chico Buarque o fio condutor. Comentando sobre seu processo de criação, especialmente da composição de suas canções, Chico traça um caminho a percorrer atento ao trajeto, pois muitas coisas podem acontecer. Uma palavra, por exemplo, aparece sem querer ou um acorde errado. Errado? É criação, não tem certo nem errado. Sugere o erro enquanto possibilidade, caminho diferente ou mesmo um atalho que leve para um resultado tão ou ainda mais interessante. Segundo ele, o próprio Leonardo Da Vinci iniciava seus murais aproveitando as manchas existentes nas paredes para cobri-las com sua obra.

Ainda no DVD uma palavra, Chico fala sobre a composição da letra de João e Maria. Recebeu, lá pelos idos de 1976-77, uma fita cassete de Severino Dias De Oliveira, mais conhecido como Sivuca, com o pedido para que Chico escrevesse a letra para a música. O toque da sanfona e a melodia provocaram em Chico a lembrança das brincadeiras de infância. Fantasiando, as crianças diziam: agora eu era o herói; agora eu era o rei; agora eu era... Num mundo em que as brincadeiras são aceitas, os tempos misturam o passado lírico ao presente sapeca, e a vida fica recheada de alegria.

Essa capacidade criativa não é privilégio de alguns. É da natureza humana. A curiosidade e a vontade de desvendar os mistérios, também. É tudo uma questão de exercício associado ao olhar atento às belezas do mundo e da vida. O mesmo Chico Buarque caminhava pela Candelária no Rio de Janeiro quando ouviu os meninos poliglotas pedindo dinheiro aos turistas: monsieur have money per mangiare? Está na canção Pivete.

Assisti recentemente ao longa entre os muros da escola. O filme do cineasta francês Laurent Cantet, que venceu a Palma de Ouro no Festival de Cannes em 2008, aborda a geografia de uma sala de aula, as múltiplas relações entre aquele ambiente e as pessoas que ali convivem: alunos e professor, alunos e alunos, professor e professores, professor e pais, alunos e pais. É envolvente e muito realista: o elenco é de professores, alunos e pais na vida real que não interpretam a si mesmos, passaram por um workshop. O roteiro é inspirado no livro de bom François Bégaudeau, que interpreta o professor protagonista. Algumas dicas para o final de semana.



Publicado no Diário de Suzano

Publicado no Jornal Cidade de Rio Claro

Publicado no sítio do Jornal Cidade de Rio Claro

Ele é o cara

Luis Inácio da Silva nasceu em Garanhuns, interior de Pernambuco, em 1945. É o sétimo de oito filhos. Aos sete anos de idade, veio com a mãe e os irmãos para o Guarujá/SP numa viagem de 13 dias num “pau de arara”. Fixaram residência num cômodo atrás de um bar na Vila Carioca na cidade de São Paulo. Foi alfabetizado no grupo escolar Marcílio Dias, começou a trabalhar aos 12 anos em uma tinturaria, foi engraxate e office-boy. Formou-se torneiro mecânico no SENAI e trabalhou na metalúrgica Aliança. Em São Bernardo do Campo filiou-se ao Sindicato dos Metalúrgicos em 1968, foi eleito diretor sindical, eleito presidente em 1975 e reeleito em 1978, foi importante liderança política na restauração da prática de greves. Na luta pela redemocratização do país, junto a outros sindicalistas, intelectuais, católicos da teologia militantes da libertação e artistas, fundaram um partido para representar os interesses da classe trabalhadora, o PT. Foi preso pelo DOPS. Foi Deputado Federal constituinte e chegou à Presidência da República.

Descendente de três gerações de generais, Fernando Henrique Cardoso nasceu no Rio de Janeiro em 1931. Sociólogo, lecionou na USP onde assumiu a cátedra de ciência política. Lecionou no Chile, na França, Inglaterra e nos Estados Unidos. Foi pesquisador e diretor do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP), militou no antigo Movimento Democrático Nacional (MDB) estimulando a aproximação ao Partido Democrata norte-americano. Seu trânsito junto aos militares e à maçonaria, facilitou o diálogo com setores conservadores na transição da ditadura para redemocratização. No Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), foi senador líder do governo José Sarney, ministro do governo Itamar Franco. Foi presidente da república por dois mandatos.

FHC é um intelectual vaidoso. Lula é uma das maiores lideranças políticas do mundo na atualidade. Serra e Aécio Neves fogem do príncipe da sociologia, a âncora eleitoral. Por melhorar a vida de milhões de brasileiros/as, o governo Lula conquista índices de aprovação jamais vistos, a aprovação pessoal do presidente é simplesmente impressionante. Com o apoio integral de Lula, Dilma Roussef será a primeira mulher presidente do Brasil. Essa situação deve incomodar muito as elites conservadoras desse país.

Aqui em Suzano o raciocínio é bem parecido. Filho de uma família simples lá do Jardim Revista, um jovem negro implementou políticas públicas e mudou para melhor a vida dos/as suzanenses. A primeira gestão de Marcelo Candido realizou mais que seu antecessor que administrou a cidade várias vezes influencia seus destinos desde que se elegeu vereador em 1973. Nas eleições de 2008, Marcelo Candido derrotou esse ícone da direita reacionária e conservadora de Suzano e continua governando para uma cidade inteira. São dois projetos antagônicos que polarizam a política local e permitem comparações na região. Isso deve incomodar muito as elites conservadoras desta cidade a ponto de seus representantes na câmara municipal tentaram incansavelmente desestabilizar um governo aprovado pelo povo.

Ivan Rubens Dario Jr.

A manga tem sabor de infância

Lara e sua manga. Foto da Fabiane.
A manga é o fruto da mangueira. Originária da Índia, chegou ao Brasil trazida pelos colonizadores. Árvore de porte elevado em seu estágio selvagem, copa frondosa e sombra convidativa. No prefácio de 'À sombra desta mangueira', Paulo Freire conta que as árvores sempre o atraíram, inclusive os pássaros multicores e cantadores que nelas repousam. “O título deste livro é uma licença que me permito e com a qual sublinho a importância que teve na minha infância a sobra de diferentes árvores. (...) Sombra e luz, céu azul, horizonte fundo e amplo dizem de mim. Sem eles apenas sobrevivo, menos que existo. Minha biblioteca de adulto tem algo disso. Às vezes, é como se fosse a sombra da mangueira da minha infância.”

Mangueira pode ser a árvore da família das anacardiáceas (Mangifera indica), de origem asiática, de flores pequeninas e ordenadas em tirsos, e cujo fruto é uma drupa carnosa e saborosa, do qual há numerosas variedades. Manga e mangueira podem ainda ser tantas outras coisas.

Mangueira pode ser o tubo de borracha ou plástico para condução de água, ou ainda um grande curral. Manga pode ser uma parte da peça de vestuário, pode ser um grupo, ajuntamento, bando ou turma.

Para mim, a manga é sonora. Soa o calor dos trópicos, transpira e enche a boca d’água: “MAANNGA”. Quem já visitou o Museu da Língua Portuguesa sabe do que estou falando. Aproveite para passear no parque da Luz, na Pinacoteca do Estado e para observar o vai e vem frenético e cosmopolita que parte e chega à estação da Luz. E tem um piano à disposição da multiplicidade dos talentos populares e eruditos.

A manga pode ser bonita, cheirosa e adocicada. Manga verde com sal, saborosa quando amarela, sedutoramente vermelha quando bem madura. Descascar a manga com os dentes e comê-la com as mãos, escapando da boca e escorrendo manga pelo corpo. Os fiapos da manga no vão entre os dentes? Nada que um fio dental não resolva. Suco de manga e geleia são delícias difíceis de descrever.

A manga pode ser divertida. Mangar significa caçoar, zombar. Tem sabor de quintal, de comer fruta no pé. Tem sabor de jabuticaba, por incrível que possa parecer, a manga tem sabor de outras frutas. Tem sabor de pitanga e até de laranja poncã.

A manga, danadinha, tem vida. Pelo menos as mangas das mangueiras do quintal dos meus tempos de menino. A manga brinca de esconde-esconde, joga futebol de golzinho, joga hóquei sobre patins, sem os patins é claro, nas traves de caixote de laranja que pegávamos na quitanda para jogar com os cabos de vassoura. Como pode uma criança crescer sem um quintal para brincar? O quintal da minha infância era interminável de tão grande. Ainda hoje sua imensidão cabe na memória deste adulto. Esse espaço para brincar chamado quintal, cujos limites físicos estabelecidos pelos muros não limitam as fantasias e a infância.

Mangueira pode ser, ainda, tradicional escola de samba carioca. O corpo docente é influente: Cartola, Carlos Cachaça, Jamelão, Nelson Sargento, dona Neuma, dona Zica e tantos/as mais. Mangueira, teu cenário é uma beleza. Intacto na memória o casarão da Rua 5 com Avenida 8, fresquinhas na lembrança as duas mangueiras, a jabuticabeira, as laranjeiras, as abelhas que enrolavam no cabelo. Os cães e gatos que durante muito tempo viveram em harmonia, assim como o pintinho que dividia a tigela de ração com a gata. Pode parecer história, e é. Histórias de tempos idos que trago no peito e na memória, assim como as brincadeiras e os amigos, as amigas, as alegrias e as fantasias que nunca morrerão e nunca crescerão. E como era grande o meu quintal. Já não dá mais para correr no quintal da minha infância. Ele continua do mesmo tamanho. Eu é que cresci. Portanto, o quintal da minha infância está bem menor. Já não comporta mais as intermináveis brincadeiras, as ilimitadas histórias, as irrealizáveis fantasias. Ou seja, proporcional às dimensões reduzidas das infâncias de um adulto.

A manga tem sabor de infância.

Ivan Rubens Dário Jr

Publicado no Jornal Cidade de Rio Claro em 01 de Abril de 2010

Disponível no sítio do Jornal Cidade de Rio Claro

Farsas eleitorais

Não é novidade que várias eleições são definidas pelo marketing. Foi assim em 1989 quando a maioria foi convencida de que Collor representava novidade, mudança, progresso. Foi assim que convenceram o eleitorado paulistano que Pitta era um homem de luta e que representava São Paulo. Foi assim que um candidato de trajetória no mínimo duvidosa foi eleito escondido na ideia de que São Paulo já sabe que o prefeito é Kassab. Quem?!

A prática de falsear a realidade e ludibriar o eleitorado com estratégias de marketing é ação comum dos partidos da chamada direita no Brasil. Vejamos alguns exemplos: o Partido de Kassab foi Arena, partido que sustentou a ditadura, depois virou PDS (Partido Democrático Social) onde se reuniram as oligarquias mais conservadoras, virou PFL (Partido da Frente Liberal) e agora, tentando apresentar-se simpático à sociedade, ressurge como Democratas. Democratas? Chega a ser ofensivo à origem grega da democracia (demo: povo; cracia: poder).

Durante a campanha eleitoral, Kassab também atacou a gestão Marta (2000-04) dizendo que ela não acabou com as escolas de lata. O que Kassab não disse é que as escolas de lata foram criadas nas gestões Maluf (1993-96) e Pitta (1997-2000), que contaram com a participação do mesmo Kassab. Foi, por exemplo, Secretário de Planejamento de Pitta, que por sua vez foi secretário de Finanças do Maluf. Como diria o Dudu Nobre: “Essa família é muito unida...”

Além de acabar com muitas escolas de lata, Marta criou os CEUs (Centros de Educação Unificada), grandes escolas que oferecem aos alunos e à comunidade mais do que aulas tradicionais, garantia também cursos de artes, cinema, opções de cultura, esporte e lazer, priorizando áreas mais necessitadas a partir de um estudo profundo a partir do ‘mapa da exclusão social . A aliança PSDB-PFL/DEM, incluindo Pitta, Maluf, Kassab, José Serra, Geraldo Alckmin, e suas bancadas legislativas, foram contra a criação dos CEUs. Acompanhamos os debates na tribuna da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo no período da implantação da política dos CEUs quase que diariamente. Hoje, política pública consolidada, significa um avanço significativo para a população paulistana, especialmente aos/às mais desassistidos pelo poder público.
Os CEUs foram criados, mudaram para melhor a vida de muita gente. Em 2008, Kassab mostrava os CEUs no seu programa eleitoral dizendo que foi ele quem fez.

Em Suzano, município da zona Leste de São Paulo, um candidato prometeu de tudo nas eleições de 2008. Concorria à chefia do poder executivo pela quinta vez. E, só para variar, tentava capitalizar politicamente para si as conquistas populares implementadas pelos governos do campo democrático-popular cujas políticas estão coerentes com o projeto de construir uma sociedade justa, democrática e igualitária. Para o PFL/DEM não passam de peças publicitárias eleitorais.

Essa prática está ficando manjada... Segundo a Folha de São Paulo (03/02/09), o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro pediu às emissoras de TVs Globo e Bandeirantes informações a respeito de campanhas publicitárias da Sabesp veiculadas no Estado. Na resposta da Globo, a agência Nova S/B pagou um total R$ 7,450 milhões para patrocinar a campanha que contava com inserções em rede nacional. Ainda segundo a matéria, o então presidente do TRE-RJ, desembargador Alberto Motta Moraes, ficou surpreso ao ver a inserção na Band. É uma empresa pública estadual, sem prestação de serviço no Rio. Tive contato com o presidente do TRE do Amapá, onde também houve esse tipo de propaganda. Ele vai adotar a mesma providência. Vamos entrar em contato com o Ministério Público Eleitoral. O Tribunal Superior Eleitoral também será informado, disse Moraes.

O TRE quer analisar eventual uso da máquina em benefício de possível candidatura do governador José Serra (PSDB) à Presidência da República. As inserções foram exibidas pela rede Globo duas vezes por dia, durante 45 dias, de dezembro a janeiro. O mesmo José Serra que prometeu investimentos públicos em Suzano condicionando-os à eleição do seu candidato em 2008, que foi derrotado. E agora, José? O povo ainda espera os investimentos públicos prometidos.

Ivan Rubens Dário Jr

Publicado no Jornal Cidade de Rio Claro em 11 de março de 2010
Publicado no sítio do Jornal Cidade de Rio Claro
Publicado no sítio Incorporativa - a revista corporativa

por que anda agora falando de mim? ou a estrela de Israel

A propósito da fala de um vereador à câmara municipal de Suzano no uso da tribuna que repercutiu no jornal Diário de Suzano de 03/12/2009.


A estrela de Israel

É de Chico Buarque de Holanda a canção INJURIADO que está no álbum Carioca lançado em 1998. Envolta num episódio no mínimo curioso, a canção diz assim:

Se eu só lhe fizesse o bem / Talvez fosse um vício a mais / Você me teria desprezo por fim / Porém não fui tão imprudente / E agora não há francamente / Motivo para você se injuriar assim. Dinheiro não lhe emprestei / Favores nunca lhe fiz / Não alimentei seu gênio ruim. Você nada está me devendo / Por isso, meu bem, não entendo / Porque anda agora falando de mim.

Garantida a aprovação da emenda constitucional que permitiu sua reeleição, em conversa com Mário Soares, ex-presidente de Portugal, Fernando Henrique Cardoso disse que Chico Buarque era um artista da ‘elite tradicional’. “Quer ser crítico mas é repetitivo”, disse. Em 1994, Chico havia apoiado Luis Inácio Lula da Silva para presidente da república, enquanto Gilberto Gil e Caetano Veloso ficaram com FHC. Este, por sua vez, rasgou-se em elogios aos dois baianos. Ao torná-la pública, o tiro saiu pela culatra pois Gil e Caetano posicionaram-se a favor de Chico.

Quando do lançamento do álbum ‘Carioca’, em 1998, Chico foi bombardeado com perguntas relacionando a canção ‘Injuriado’ ao episódico FHC. Em resposta, afirmava que fulanizar uma questão que é política (Chico fez oposição ao governo FHC) é uma forma de banalizar a política. Bem manjada, diga-se de passagem. E disse: “Isso é uma piada, só rindo. Primeiro porque não fiquei injuriado com nada, segundo porque nunca vou chamar Fernando Henrique de meu bem”.

Um vereador à câmara municipal de Suzano (não digo o nome a favor da boa educação) tem o hábito de utilizar essa mesma estratégia contra quem discorda dele. Para esse jovem senhor, o símbolo mais apropriado certamente não seja uma estrela, como não é de fato. A cruz gamada parece mais apropriada.

E a canção termina repetindo a seguinte expressão: “Por que anda agora falando de mim? por que anda agora falando de mim?”

Ivan Rubens Dário Jr

texto foi publicado apenas neste blog

O desafio de assumir o país democraticamente

Lá nos idos de 2005, aceitei o desafio de coordenar a implementação do Orçamento Participativo na cidade de Suzano, região metropolitana, zona Leste de São Paulo. Os municípios da região do alto Tietê caracterizam-se pela pequena alternância de poder político institucional e pelo conservadorismo. Assim, a experiência política suzanense é referência regional quando se discute a formulação e execução de políticas públicas destinadas à maioria da população na perspectiva da construção de uma cidade para todos e todas.

Falar da formulação de políticas é falar também de método. Do grego ‘méthodos’, “caminho para chegar a algum fim”. Se essa experiência de construir métodos democráticos é recente no Brasil, infelizmente em muitos municípios brasileiros o autoritarismo presente na cultura política ainda tem muita força e impede que processos cada vez mais democráticos sejam desencadeados no interior das instituições. Mandar fazer é bem mais fácil e proporcionalmente menos edificante. Nessa perspectiva, Rio Claro optou na última eleição municipal por um projeto político mais amplo, superando (espero que definitivamente) o outro projeto mais estreito, representado pelas figuras conservadoras da política local.

Iniciamos a implementação do Orçamento Participativo (OP) em Suzano diante do desafio de exercitar um governo municipal conectado com o esforço imenso de ampliar a democracia no país. Enquanto marca, denominamos participação popular um conjunto de ações nas diferentes áreas e trabalhamos essa idéia como eixo de governo. Animados(as), escolhemos a trilha sonora: ‘Vai passar’ de Chico Buarque.

Da mesma forma, um sem número de debates, livros e textos, conversas e canções nos animaram. Uma fala de Paulo Freire ajuda a dimensionar o desafio: “Tudo que a gente puder fazer no sentido de abrir mais a escola, no sentido de provocar, pedir, convocar, desafiar estudantes, merendeiras, zeladores, vigias, diretores de escola, coordenadores pedagógicos, médicos, dentistas, alunos, vizinho da escola, tudo que a gente puder fazer no sentido de convocar os que vivem em torno da escola e dentro da escola, no sentido de participarem, de tomarem um pouco o destino da escola na mão também. Tudo que a gente puder fazer nesse sentido é pouco ainda, considerando o trabalho imenso que se põe diante de nós que é o de assumir esse país democraticamente. Quer dizer: o de ter voz, de ganhar voz e não apenas o de falar, não apenas o de dar bom dia. Ora, o conselho de escola é um dos momentos, um dos meios de que a gente pode se servir, se é que eu posso usar esse verbo, nessa luta pela democratização da escola e pela democratização do ensino no Brasil.” Nosso grande educador disse isso no período em que foi Secretário Municipal de Educação durante a gestão de Luiza Erundina na Prefeitura de São Paulo.

Mas o raciocínio ganha amplitude e provoca inspiração se considerarmos que a atividade política é também pedagógica, e que todos os processos desencadeados no campo da ampliação da democracia são educativos. Para mim, trata-se de mostrar para as pessoas a necessidade de se apropriar daquilo que é nosso, daquilo que é de todos e todas, daquilo que é do povo. Todos os espaços e oportunidades se somam na construção paciente e cotidiana da democracia nas cidades e no país.

Você estava pensando que me esqueci do estado? não esqueci, não. É que na atual conjuntura, essa luta no estado de São Paulo é ainda muito maior.

Ivan Rubens Dario Jr.

Publicado no Diário de Suzano
Publicado no Jornal Cidade de Rio Claro em 02 de dezembro de 2009
Publicado no sítio do Jornal Cidade de Rio Claro

Cidade maravilhosa, cheia de encantos mil

Adoro viajar. Gosto de conhecer lugares, de vivenciar outras culturas. Recentemente, estive no Rio de Janeiro, ex-capital da República, com meus primos Pedro (15) e Giovanna (12). Iniciamos o passeio pela Confeitaria Colombo (1894), que preserva sua arquitetura art nouveau, imensos espelhos belgas, mármores italianos e mobiliário em jacarandá, local outrora frequentado por Olavo Bilac, Chiquinha Gonzaga, Rui Barbosa, Villa Lobos, entre outros.

Na Biblioteca Nacional (1910), descobrimos um acervo de 5 milhões de obras e registros. No Museu Nacional de Belas Artes (1937), pinturas de Tarsila e Portinari, desenhos de Anita Malfatti, gravuras de Miró, Goya e Picasso e, bem pertinho, a beleza do Teatro Municipal (1909), que está em restauração. A Igreja da Candelária e a inevitável lembrança do massacre de crianças e adolescentes em situação de rua, em 1993. Por que morar numa praça fria e perigosa? Tudo provocava uma boa conversa.

A caminho do Estádio Mário Filho, jornalista irmão de Nelson Rodrigues, observamos outra paisagem carioca pelo vidro do trem. Do tupi-guarani, Maracanã significa semelhante a um chocalho, em homenagem às aves Maracanã-guaçu que ali existiam, e ao rio que cruza a Tijuca e São Cristóvão e deságua na Baía da Guanabara. Jogavam Flamengo e São Paulo no Maracanã lotado. Sai cabisbaixo.

Falamos sobre diversidade na Lapa e em Ipanema. Para ele e também para ela, o importante é ser feliz. E se escolhas à procura da felicidade estão na dimensão individual, do jeito deles criticavam a homofobia e valorizavam os direitos da pessoa humana. Desejávamos em nossa conversa uma sociedade tolerante, justa e respeitosa.

Nessa perspectiva, conheci o Bairro Educador, projeto da Prefeitura do Rio de Janeiro e do Ministério da Educação, iniciado na Cidade de Deus e hoje também no Morro do Alemão, onde não à toa uma área pública ficou conhecida como Praça Kosovo, as trilhas educativas vão alterando as ocupações. As escolas vão ocupando espaços, aproveitando os saberes acumulados, tornando-os lugares educativos. Os territórios são, devagarzinho, devolvidos às crianças. A escola vai se derramando pelo bairro.

Um resultado que chamou minha atenção foi a recuperação de áreas públicas a partir de um trabalho pedagógico em que alunos e alunas pesquisaram o bairro. Eram três ‘arquitetos’, um ‘fotógrafo’ e um ‘jornalista’. Acompanhados por educadores e educadoras, os relatórios alimentaram os projetos de recuperação de espaços urbanos pela prefeitura. Um professor sacou que é mais legal aprender fração numa oficina de arte culinária. Falou com a merendeira. Quantos gramas de farinha? Quantos mililitros de água? Comeram ¾ de uma pizza de oito pedaços.

A escola ficou bonita quando os alunos e alunas das oficinas de pintura e mosaico resolveram decorar os muros externos. Um dia não precisarão dos muros. Aliás, deu para trabalhar os eixos cartesianos. E mais: os alunos e alunas cuidam do paisagismo nas imediações da escola. Aprenderam com o paisagista da Prefeitura e criaram a Comissão de Parques e Jardins.

Como diz um provérbio africano, é preciso uma aldeia para educar uma criança.

Ivan Rubens Dario Jr.

Publicado no Diário de Suzano
Publicado no Jornal Cidade de Rio Claro
Publicado no sítio do Jornal Cidade de Rio Claro
Qui, 22 de Outubro de 2009

É proibido fumar ou proibir?

“É proibido fumar, diz o aviso que eu li”, cantavam a partir de 1964 o bom moço Roberto Carlos e o ‘tremendão’ Erasmo Carlos. Eu ainda nem pensava em nascer. Sou de 1971. Porém, sendo uma canção bem conhecida, inspira uma reflexão acerca da Lei Antifumo proposta pelo governador do estado de São Paulo e aprovada por 69 deputados estaduais contra 18 votos. Estiveram presentes 88 dos 94 parlamentares na sessão.

Não fumo, não gosto da fumaça, não gosto do cheiro de cigarro. Mas proibir o consumo de cigarros em locais públicos me incomoda tanto quanto o cigarro ou mais. Por essa razão, ao debater sobre a Lei Antifumo, quero contribuir com algumas reflexões.

Alguém entra num bar e tira a roupa. A turma chama a polícia e o peladão vai preso. Seguindo a lógica da Lei Antifumo, o peladão fica numa boa e o dono do bar é quem vai em cana. E o proprietário é responsabilizado pela contravenção cometida no seu próprio estabelecimento comercial. Ou seja, a irresponsabilização de quem infringe a lei e a responsabilização do proprietário como se ele fosse cúmplice de um homicídio. Não dá para punir alguém pelo ato cometido por outra pessoa. A liberdade de escolha e a responsabilização individual são duas grandes conquistas éticas da civilização ocidental.

O verborrágico governador lista índices de saúde para punir a sociedade que, por sua vez, confunde saúde com acesso aos medicamentos. Os danos à saúde provocados pelo cigarro, além de estarem constantemente nos veículos de comunicação, estão estampados nos maços de cigarro, o que garante às pessoas razoável volume de informações sobre os danos à saúde causados por essa droga lícita. Contudo, é central na discussão o distanciamento entre o conceito de saúde enquanto sinônimo de bem viver, superando o entendimento minimalista de acesso ao tratamento e à medicação. É central, exceto para o governador do estado de São Paulo.

Outro aspecto é o da judicialização excessiva da vida em detrimento dos direitos individuais, dos direitos fundamentais, a partir de um Estado impositor, um governo truculento e pretensioso em ditar até aquilo que seduz as pessoas pelo prazer. Por outro lado, um grande amigo meu, fumante convicto, fala das estratégias absurdamente criativas para saciar o vício em locais proibidos. Ou seja, existe um resultado inverso a partir da Lei Antifumo: o prazer na transgressão. Torna-se irresistível transgredir, potencializando o prazer de fumar.

Freud explica que as pessoas gostam do prazer e da dor. Em outras palavras, os impulsos de vida e os impulsos de morte. Dá para escolher viver tranquilamente por mais tempo ou viver mais intensamente mesmo que dure pouco tempo. Os prazeres da vida, mesmo que encurtando seu percurso, são escolhas (ou decisões) que estão limitadas à dimensão individual.
A Lei Antifumo fere direitos democráticos. Em grego, phármakon significa remédio, cuja tradução também pode ser ‘veneno’. E, nesse caso, o remédio proposto pelo governador do estado de São Paulo é veneno para uma sociedade democrática. Aliás, como é esquisito ver os deputados estaduais que votaram a favor dos interesses demagógicos e eleitoreiros presentes na Lei Antifumo rebolando para fumar sua cigarrilha e seu charuto. De elogiável disposição...

Por fim, também na década de 1960, Caetano Veloso cantava que “é proibido proibir”. Conclusão da história: o governador prefere ouvir o bem comportado Roberto Carlos.

Ivan Rubens Dario Jr
(O autor é não fumante agredido pelos ‘efeitos colaterais’ da Lei Antifumo)


Publicado no Diário de Suzano
Publicado no Jornal Cidade de Rio Claro em 23 de setembro de 2009
Publicado no sítio do Jornal Cidade de Rio Claro