Amores e Espumas ao vento



Quem nunca brincou de bola de sabão? ou na infância dos corpos crescidos, duas mãos ensaboadas estendidas, um sopro forte de lábios: espumas ao vento… O pernambucano Accioly Neto nascido em 1950 e falecido em 2000, escreveu um forró que diz assim:


Sei que aí dentro ainda mora um pedacinho de mim / Um grande amor não se acaba assim / Feito espumas ao vento


Leve, a espuma voa para longe até se desfazer. Parece que é assim também com um amor: leve feito espuma, se desfaz com o vento, desmancha no ar. Apesar do desfazimento, do desmanchamento, parece que não se apaga. E não se apaga porque deixa marcas, profundas marcas.


Não é coisa de momento / Raiva passageira / Mania que dá e passa feito brincadeira / O amor deixa marcas que não dá pra apagar


Terminar um grande amor é uma espécie de luto. Sim, porque o luto se situa na dinâmica entre dois pólos da existência humana: a vida e a morte. Como a perda é real, sente-se uma tristeza profunda mas que é, contudo, superada com o passar do tempo. A exemplo do luto, associemos a perda de um grande amor a uma espécie de morte: algo morreu aqui dentro de quem ama.


Sei que errei e estou aqui pra te pedir perdão / Cabeça doida, coração na mão / Desejo pegando fogo


Podemos também associar um grande amor a uma espécie de vida. Uma vida maior, mais colorida, mais cheia de sentido, mais intensa. “Quando a gente ama é o clarão do luar”, diz um samba. Ou, “o amor é fogo que arde sem se ver” disse o português Luiz de Camões em Os Lusíadas.... o amor é fogo, o amor arde, o amor é chama, o amor é quente… e quando ele chega ao fim, bate aquela tristeza, aquela vontade danada de não deixá-lo ir, uma vontade de poder ressuscitá-lo como fez o super-homem ao voar contra o movimento de rotação para, fazendo a Terra girar para trás, fazendo o relógio rodar para trás, salvar da morte, com seus super poderes, a mulher amada. Esta cena emblemática do filme Superman foi representada por Gilberto Gil em ‘Super Homem - a canção’.


Sem saber direito aonde ir e o que fazer / Eu não encontro uma palavra só pra te dizer / Mas se eu fosse você, amor, eu voltava pra mim de novo


As marcas deixadas por um grande amor não são necessariamente marcas de dor. Cicatriz é uma marca na superfície do corpo. Cicatrizes lembram machucados, ferimentos. Cicatrizes são marcas de dor. Tatuagens também são marcas na superfície do corpo. Tatuagens costumam representar bons afetos, bons momentos, gente querida. Entretanto, lá no fundo, aqui dentro do corpo, o amor deixa marcas que não se pode apagar. Depois de um grande amor não somos mais a mesma pessoa. Superado o luto, percebemos que fica dentro da gente um pouco da pessoa amada. Estamos diferentes, somos mais, estamos melhorados com (ouso dizer) a melhor parte da pessoa amada que ficou aqui dentro, numa espécie de corpo emocional ou, como dizem, dentro do coração. O compositor recomenda não fechar a porta. Porque uma fresta é suficiente quando um amor pede passagem. E quando se sente o corpo vibrando por dentro, aquele amor continua pulsando, a chama não se apagou, o chão de amor permanece fértil para germinar a semente e brotar mais uma vida nova. É festa !!!


E de uma coisa fique certa, amor / A porta vai estar sempre aberta, amor / O meu olhar vai dar uma festa, amor / Na hora que você voltar


com Mariana Aydar

com Fagner

com Elza Soares

para o filme Lisbela e o prisioneiro