“O óbvio só é óbvio depois de descoberto”...

Ao ouvir a frase que intitula este artigo, encontrei o pré-texto para o debate desta semana. João Bosco, um dos músicos que mais ouço e admiro, falava da simplicidade que torna genial a canção O Vento, de Dorival Caymmi. Você deve estar se perguntando: qual a relação disso com nossa experiência de Orçamento Participativo? No dia da publicação do nosso último artigo (8/7), aconteceu a Assembléia Geral dos Representantes, a ágora (praça das antigas cidades gregas onde eram realizadas as assembléias públicas) do OP.

Na oportunidade, todos os representantes presentes escolheram mais 12 conselheiros (e 12 suplentes) para o conselho do OP (Corpo). Bom lembrar que a correlação de forças entre as regiões era desigual, uma vez que o critério de mobilização popular é o que garantia a escolha de representantes durante as plenárias, obedecendo à razão de um representante para cada 15 participantes. Ou seja, a mobilização popular nas plenárias é diretamente proporcional à quantidade de representantes.

Os representantes presentes na Assembléia Geral pactuaram manter o equilíbrio no Corpo ao registrarem apenas uma candidatura por região. Demonstração de senso de justiça, compreensão de cidade e capacidade de negociação. A experiência do OP nos permitiu essa descoberta e agora podemos até dizer que, em se tratando do povo de Suzano, isso é obvio.

Conhecendo os/as 24 conselheiros/as eleitos/as pela população, nos reunimos para discutir os próximos passos. No dia 30 de julho acontecerá o 1o Seminário de Formação do Corpo. É o momento de conhecer melhor o orçamento público municipal e a legislação que disciplina o uso desse recurso, compreender o funcionamento da máquina pública, especialmente em áreas cujo funcionamento é organizado em sistemas; as competências da União, Estado e Município, as possibilidades de investimentos e seus respectivos impactos de custeio.

Tudo isso prepara, forma e informa o conselho, visando à tomada das decisões durante as reuniões ordinárias. Serão ricas tardes de sábado conforme definição dos próprios conselheiros.

Registrar a experiência do OP enquanto mecanismo de participação popular junto ao governo é discutir uma forma de governar a cidade e, nesse sentido, penso que é necessário destacar o que, no meu ponto de vista, tem uma separação abissal. O “jeito” de funcionar da Prefeitura não é espontâneo, ele é produzido por várias forças.

No caso de Suzano, esse “jeito” foi produzido por uma sucessão de governos refratários à participação da população nas decisões. Ao colocar participação popular como um dos cinco eixos, o governo Marcelo Candido provoca uma mudança na cidade imaterial, por desencadear um movimento de construção de outra lógica de governo. À medida em que o povo participa, se apropria da máquina pública e esta, por sua vez, se adapta aos anseios populares e mais se aproxima da(s) realidade(s) local(is). É a riqueza do encontro de dois poderes: do poder constituinte com o poder constituído.

Cada vez mais gente se apercebe protagonista na democratização da democracia.

Assembléia Geral dos Representantes do Orçamento Participativo

Encerradas as plenárias, acontece a Assembléia Geral dos Representantes do Orçamento Participativo, objeto de nossa discussão neste artigo. Para facilitar o entendimento, podemos dizer que o OP em Suzano foi organizado em duas fases: fase externa e fase interna. A primeira compreende as reuniões preparatórias e as plenárias regionais deliberativas. Foram 217 reuniões preparatórias que, além de estimular a participação nas 12 plenárias regionais deliberativas, como o próprio nome diz, prepararam os participantes e, conseqüentemente, qualificaram a tomada de decisão. Está desencadeado o processo de socialização das informações acerca do orçamento público, o dinheiro arrecadado dos impostos e taxas pagos por todos e, portanto, dinheiro de todos.

Importante destacar que as informações democratizadas durante essa fase, por mais elementares que possam parecer àquelas pessoas que conhecem minimamente as questões do orçamento e da administração pública, surpreendeu a grande maioria das pessoas que estiveram nas reuniões. Isso se justifica pelos quase 30 anos de silêncio em que o povo aguardava os favores dos administradores de plantão.

Com as diversas experiências de participação popular desencadeadas com ousadia pelo governo Marcelo Candido, dentre elas o OP, nosso povo se percebe senhor de direitos. Nas 12 plenárias, encontros cheios de vida e que revelaram o amor por nossa cidade, 1.486 mulheres e homens elegeram as 36 prioridades do OP e também 12 conselheiros que acompanharão a seqüência dos trabalhos. Noventa e dois representantes foram eleitos nos 46 grupos de trabalho que aprofundavam os debates. Os GTs mostraram-se espaços interessantes de construção coletiva do conhecimento, espaços de diálogo e discussão, onde a dialética, além de ampliar o cabedal de conhecimento, colocou os presentes num movimento de construção de consensos, pactos e acordos.

O Conselho do OP (CORPO) será composto por 32 pessoas, sendo 24 da população. Nas plenárias, cada região já elegeu seu conselheiro. Na Assembléia Geral, os representantes elegerão as últimas 12 vagas entre seus membros. As regiões se encontram, as pessoas se encontram, as diferentes realidades se encontram, toda energia que levaram às 36 prioridades eleitas se encontram e, neste encontro, lançamos nossos olhares para a cidade de Suzano. Passamos, portanto, do olhar de parte para um olhar do todo. Com a Assembléia, tem início a fase interna do OP.

Numa colcha de retalhos, uma linha une as partes para formar o todo. Nossa “linha” é a topofilia (do grego Topos: lugar, Philía: “amizade”, “afinidade”, “amor”). Assim, continuamos alinhavando, trilhando e desbravando caminhos de (re)invenção da democracia.

No próximo encontro discutiremos o CORPO. Até lá.