Ver ocaso

Ver o nada
Perfeitamente
Porque perfeita, mente
A mentira perfeita
Tipo crime que não se desvenda
Olhares fechados a olhos abertos
Apagamentos
Ocaso

E a vida o que é, meu irmão?


Eu fico com a pureza da resposta das crianças / É a vida, é bonita e é bonita…

Uma colega mostrou citação no material didático: “a beleza de ser um eterno aprendiz”. Ela estava preparando uma formação para professores e pensava no dualismo ensino - aprendizagem. Pensei na densa obra de Luiz Gonzaga Jr e na sua capacidade de ultrapassar as obviedades. E convidei minha amiga para ouvir a canção.

Viver e não ter a vergonha de ser feliz / Cantar e cantar e cantar / A beleza de ser um eterno aprendiz / Eu sei que a vida devia ser bem melhor e será / Mas isto não impede que eu repita / É bonita, é bonita e é bonita

A letra remete à ideia de aprendizagem. A aprendizagem nos leva a pensar no ensino. Ensino e aprendizagem são palavras (e conceitos) que andam de mãos dadas. Na minha modesta opinião, Gonzaguinha está falando de outra coisa, de algo maior, algo que vai além… e diz isso com otimismo porque, cantando, a vida é mais viva. Assim, o artista lança perguntas:

E a vida? / E a vida o que é, diga lá, meu irmão? / Ela é a batida de um coração? / Ela é uma doce ilusão? / Mas e a vida? / Ela é maravilha ou é sofrimento? / Ela é alegria ou lamento? / O que é, o que é, meu irmão?

São muitas possibilidades de resposta, da biologia às religiões. Prefiro cultivar a pergunta, mantê-la viva no sentido da busca por respostas, mesmo que provisórias, para acalentar um corpo curioso. Gonzaguinha nos lança numa busca filosófica com os pés fincados no chão.

Há quem fale que a vida da gente / É um nada no mundo / É uma gota, é um tempo / Que nem dá um segundo / Há quem fale que é um divino mistério profundo / É o sopro do criador numa atitude repleta de amor / Você diz que é luta e prazer / Ela diz que a vida é viver / Ela diz que melhor é morrer / Pois amada não é e o verbo é sofrer / Eu só sei que confio na moça / E na moça eu boto a força da fé

Há quem diga isso e aquilo da vida: você diz, ela diz… Gonzaguinha confia na jovem mulher e, com ela, afirma: “somos nós que fazemos a vida”, cada ser é autor da sua própria canção. E o desejo empurra a vida para a frente.

Somos nós que fazemos a vida / Como der ou puder ou quiser / Sempre desejada, por mais que esteja errada / Ninguém quer a morte, só saúde e sorte / E a pergunta roda e a cabeça agita / Fico com a pureza da resposta das crianças / É a vida, é bonita e é bonita

O tempo passa, a morte é certa. Entre o passado (que não volta mais, exceto nas lembranças) e o futuro (incerto), temos o presente. O que temos feito da vida neste tempo presente? Como criança entende de presente, Gonzaguinha conclui com elas: A vida é bonita ao quadrado.

Viver e não ter a vergonha de ser feliz / Cantar e cantar e cantar / A beleza de ser um eterno aprendiz / Eu sei que a vida devia ser bem melhor e será / Mas isto não impede que eu repita / É bonita, é bonita e é bonita

Criança canta, criança brinca. Criança se permite viver as belezas e as sutilezas do aqui e do agora. Criança se faz presença. Uma criança não passa despercebida. Quem nunca viu uma criança concentrada numa brincadeira, como se o mundo estivesse completamente parado? Podemos pensar na infância para além do tempo cronológico, não apenas como uma etapa da vida mas como uma experiência de relação com o tempo, com o mundo e com a própria vida. Talvez isso esteja entre ensino e aprendizagem.

Ivan Rubens
estudante de educação