Em Rio
Claro, a Consocial está programada para o início de dezembro. “É a primeira vez
que o país vai discutir como controlar a máquina pública e o governo. Isso
nunca foi visto no Brasil e, portanto, tem um valor muito grande”, disse a
secretária de governo Olga Salomão. E ela tem razão. Mas antes disso, ainda
neste final de semana, acontecerá a Conferência Municipal de Política Cultural.
Há quase um ano não nos vemos e nosso último encontro não foi dos mais
alegres. Vamos falar das boas lembranças, momentos alegres e intensos que partilhamos,
e das coisas que estão acontecendo desde sua partida. Tem muita coisa
importante acontecendo aqui.
Lembro como se fosse hoje meu primeiro contato com suas idéias. Foi
na plenária de encerramento do mandato do então Deputado Estadual Marcelo
Candido, lá pelos idos de dezembro de 2004 quando você e o filósofo Roberto
Romano fizeram um debate político de alto nível. Acompanhei sua preparação, as
leituras habituais e seus textos. Não o cumprimentei à época. Junto dos
parabéns pela brilhante contribuição, digo que me arrependo de não insistir
contigo para publicar seus escritos.
Alguns meses depois, em 2005, também assumimos a responsabilidade de
governar Suzano compondo a equipe de governo do Partido dos Trabalhadores com o
particular desafio de criar mecanismos para
democratização da gestão pública. Reuniões preparatórias foram algumas
centenas, quarenta plenárias do Orçamento Participativo e do PPA Participativo,
formações de conselheiros de escola, reuniões de conselho e vai por aí. Das
inesquecíveis viagens de intercâmbio pelo Brasil em Fóruns e Seminários. Sempre
em boa companhia mergulhamos nesse universo e nesse tema. Vivemos boas
experiências que estão se eternizando numa perceptível mudança na cultura
política local. Modesta se analisada na perspectiva de um país cuja democracia
é muito jovem, mas enorme na perspectiva das mudanças possíveis neste momento
histórico e neste curto espaço de tempo. Você repetia como um mantra: “não há
democracia sem participação popular”. Seguindo o teu exemplo, dialoguei com
essa reflexão num texto publicado em agosto de 2008.
Ainda
hoje vejo suas opiniões sobre futebol, sobre o cotidiano, e sua reflexão
política postados nos sítios especializados na internet. Sempre admirei sua desenvoltura na lida com a tecnologia
e no mundo virtual. Sempre cito seu exemplo em ingressar na universidade já
sexagenário.
Tenho
várias coisas para te contar, Juarez. Lembra dos ‘Encantos Pedagógicos’? A
Secretaria Municipal de Educação trabalha na reedição do projeto que você
coordenou em 2005. E outra: criamos um coletivo político socialista que leva
teu nome cujo manifesto de criação tem 122 assinaturas de apoio. A Ananda Grinkraut
acha que assumimos grande responsabilidade e que para honrar teu nome e tua
história o coletivo deve lutar por um mundo justo a partir do diálogo e da
construção coletiva. Ela também falou da sua influência no jeito como ela vê e
dialoga com o mundo. Legal, não?
Lembra-se
das nossas idas para minha terra natal? Lembra da Floresta? Lembra do melhor
sorvete do mundo nas intermináveis taças da Gelateria?
Para você uma taça diet. No caminho
entre a floresta e a sorveteria, o ônibus de turismo com o destino escrito:
‘puta que pariu’. Muita risada. E você dizia assim: ‘imagina pegar um ônibus que
vai pra puta que pariu?’
Imagino
que o tempo dedicado à luta te afastou um pouco do convívio familiar. Pois
saiba que teus filhos e filhas reconhecem e valorizam sua luta. A Débora fica
feliz com as homenagens e lembranças que te tornam presente por aqui; o Flávio
disse que você transmitiu sua dimensão de humanidade às pessoas que tiveram
contato contigo. Saiba que ética é, para sua família, uma marcante
característica tua. Imagino que você esteja feliz ouvindo isso.
Walmir
Pinto carrega um ensinamento que ouviu de ti numa reunião do PT: não se deve
ter vergonha daquilo que é feito com amor, carinho e verdade. Cecília
Figueiredo que te acha um semeador de coletivos, disse que você e o Júlio
Mariano acreditavam na participação do povo como instrumento efetivo de lutas e
vitórias. O Ivo Reseck sente falta da sua disposição para ‘baladinhas’ e da sua
animação em convocar-nos para as mesas de bar onde resolvíamos todos os
problemas do mundo. Cecilia Tome Habu te acha uma figura maravilhosa. Vanessa
Alves disse que você vive dentro do coração da gente. Saber disso me deixa mais
tranqüilo porque de coração você entende. Putz, já ia me esquecendo: Marcelo
Candido que devota amor táctil aos livros e diz que aprendeu a anotar durante a
leitura numa conversa contigo na câmara municipal nos tempos do mandato de
vereador do José Candido.
Leonel
Luz sente falta das suas histórias sobre futebol, música e política. Te tem na
cota das pessoas que conseguem transcender gerações, te acha atemporal. E o
pessoal do setor de gestão democrática da educação guarda na retina a tua
imagem com microfone à mão e dedo em riste falando aos quatro cantos da
democracia com participação popular. E do seu carinhoso bom dia acompanhado de:
“chefe e merda para mim é a mesma coisa”. Sempre que a Lili (Eliana Ramos)
escuta alguém falando ‘chefe’, conta sua passagem entre risos. Esse seu
comportamento é entendido como expressão do seu espírito subversivo,
incendiário e obcecado na construção de relações de poder horizontais no
trabalho, na escola, nos partidos e etc. Estão com saudade de ti e das ‘Bachianas’
de Vila Lobos como trilha sonora desta relação de carinho e afeto.
Quanto
a mim, sinto muito a falta das noites divertidas com nossos amigos no Bar do Zé
Vitor em intermináveis conversas e da boa música. Não sei se já te disse dos
pensamentos que as suas histórias me provocavam. Suas reflexões sobre o
futebol, a escalação do teu Palestra das décadas de 1940 e 50, e do meu
tricolor paulista dos tempos do Teixeirinha e Canhoteiro, o Mané Garrincha da
ponta esquerda. De batucar na mesa entre um cochilo e outro, e de cantar
contigo a saudade da professorinha em ‘Meus Tempos de Criança’de Ataulfo Alves:
Eu daria tudo que eu tivesse / Pra voltar aos dias de criança
/ Eu não sei pra que a gente cresce / Se não sai da gente essa lembrança. Aos
domingos, missa na matriz / Da cidadezinha onde eu nasci / Ai, meu Deus, eu era
tão feliz / No meu pequenino Miraí. Que saudade da professorinha / Que me
ensinou o beabá / Onde andará Mariazinha / Meu primeiro amor, onde andará? Eu
igual a toda meninada / Quanta travessura que eu fazia / Jogo de botões sobre a
calçada / Eu era feliz e não sabia.
Não
sei onde você está neste momento da inauguração do Espaço Cultural Juarez
Braga, mas acho que está muito perto daqui. Na verdade, acho que está aqui
conosco, batucando na mesa, tomando uma taça de vinho tinto seco. Pensando bem,
meu amigo, você permanecerá entre nós porque sua existência está eternizada nos
seus filhos, filhas e descendentes. Suas idéias estão vivas e pulsando entre
nós. Sua trajetória é lembrada e orienta nosso trabalho. Suas histórias povoam
as nossas lembranças. Seu exemplo de homem ético, como disse seu filho Flávio
no dia em que foste homenageado no projeto Memória Viva da Secretaria Municipal
de Cultura, orientam nossa luta política na construção de uma sociedade justa.
É
tanta coisa que eu tinha há dizer mais me foge à lembrança. Dilma Rousseff
ganhou a eleição e nosso projeto político para o Brasil segue em frente. A
popularidade do ex-presidente Lula só cresce. O projeto do Hospital em Suzano
está se tornando realidade. José di Filippi é Deputado Federal e seu escritório
Político em Suzano funciona junto do nosso Espaço Cultural Juarez Braga. O Luis
Cláudio está dizendo que nosso programa de formação e debate político chama-se
‘a cidade em debate: um olhar para Suzano’, te convida para participar na certeza
que podemos contar contigo.
Em
14 de setembro último, celebrou 90 anos de idade uma das figuras
religiosas brasileiras mais importantes do século XX: o Cardeal Paulo
Evaristo Arns. Voltando da Sorbonne, foi meu professor quando ainda
andava de calça curta em Agudos-SP e depois, em Petrópolis-RJ, já frade,
como professor de Liturgia e da teologia dos Padres da Igreja antiga.
Obrigava-nos a lê-los nas linguas originais em grego e latim, o que me
infundiu um amor entranhado pelos clássicos do pensamento cristão.
Depois foi eleito bispo auxiliar de São Paulo. Para protegê-lo porque
defendia os direitos humanos e denunciava, sob risco de vida, as
torturas a prisioneiros políticos nas masmorras dos órgãos de repressão,
o Papa Paulo VI o fez Cardeal. Embora
profético mas manso como um São Francisco, sempre manteve a dimensão de
esperança mesmo no meio da noite de chumbo da ditadura militar. Todos os
que o encontravam podiam, infalivelmente, ouvir como eu ouvi, esta palavra forte e firme: “coragem, em frente, de esperança em esperança”. Coragem, eis
uma virtude urgente para os dias de hoje. Gosto de buscar na sabedoria
dos povos originários o sentido mais profundo dos valores humanos. Assim
que na reunião da Carta da Terra em Haia em 29 de junho de 2010, onde
atuava ativamente sempre junto com Mercedes Sosa enquanto esta ainda
vivia, perguntei à Pauline Tangiora, anciã da tribo Maori da Nova
Zelândia qual era para ela a virtude mais importante. Para minha
surpresa ela disse:”é a coragem”. Eu lhe perguntei: “por que,
exatamente, a coragem?” Respondeu:
”Nós precisamos de coragem para nos levantar em favor do direito, onde
reina a injustiça. Sem a coragem você não pode galgar nenhuma montanha;
sem coragem nunca poderá chegar ao fundo de sua alma. Para enfrentar o
sofrimento você precisa de coragem; só com coragem você pode estender a
mão ao caído e levantá-lo. Precisamos de coragem para gerar filhos e
filhas para este mundo. Para encontrar a coragem necessária precisamos
nos ligar ao Criador. É Ele que suscita em nós coragem em favor da
justiça”. Pois é essa
coragem que o Cardeal Arns sempre infundiu em todos os que, bravamente,
se opunham aos que nos seqüestraram a democracia, prendiam, torturavam e
assassinavam em nome do Estado de Segurança Nacional (na verdade, da
segurança do Capital). Eu
acrescentaria: hoje precisamos de coragem para denunciar as ilusões do
sistema neoliberal, cujas teses foram rigorosamente refutadas pelos
fatos; coragem para reconhecer que não vamos ao encontro do aquecimento
global mas que já estamos dentro dele; coragem para mostrar os nexos
causais entre os inegáveis eventos extremos, conseqüências deste
aquecimento; coragem para revelar que Gaia está buscando o equilíbrio
perdido que pode implicar a eliminação de milhares de espécies e, se não
cuidarmos, de nossa própria; coragem para acusar a irresponsabilidade
dos tomadores de decisões que continuam ainda com o sonho vão e perigoso
de continuar a crescer e a crescer, extraindo da Terra, bens e serviços
que ela já não pode mais repor e por isso se debilita dia a dia;
coragem para reconhecer que a recusa de mudar de paradigma de relação
para com a Terra e de modo de produção pode nos levar, irrefreavelmente,
a um caminho sem retorno e destarte comprometer perigosamente nossa
civilização; coragem para fazer a opção pelos pobres contra sua pobreza e
em favor da vida e da justiça, como o fazem a Igreja da libertação e
Dom Paulo Evaristo Arns. Precisamos de
coragem para sustentar que a civilização ocidental está em declínio
fatal, sem capacidade de oferecer uma alternativa para o processo de
mundialização; coragem para reconhecer a ilusão das estratégias do
Vaticano para resgatar a visibilidade perdida da Igreja e as falácias
das igrejas mediáticas que rebaixam a mensagem de Jesus a um sedativo
barato para alienar as consciências da realidade dos pobres, num
processo vergonhoso de infantilização dos fiéis; coragem para anunciar
que uma humanidade que chegou a perceber Deus no universo, portadora de
consciência e de responsabilidade, pode ainda resgatar a vitalidade da
Mãe Terra e salvar o nosso ensaio civilizatório; coragem para afirmar
que, tirando e somando tudo, a vida tem mais futuro que a morte e que um
pequeno raio de luz é mais potente que todos as trevas de uma noite
escura.
Para anunciar e denunciar tudo isso, como fazia o Cardeal Arns e a
indígena maori Pauline Tangiori, precisamos de coragem e de muita
coragem.
Acompanhando
o noticiário local no Diário de Suzano, um conjunto de boas notícias me levaram a pensar
no legado de um governo para sua cidade. Apenas para informar, não leio aquela
parcela da imprensa que, escamoteando suas posições políticas e eleitoras,
verte pelas páginas seu veneno contra o governo suzanense. Bem, voltemos ao
legado. Por exemplo, sediar os mais importantes eventos esportivos do mundo
exige vultosos investimentos públicos. E o que fica depois dos Jogos Olímpicos
e da Copa do Mundo de Futebol para o povo brasileiro?
Inclusive está
instalada na Câmara dos Deputados a sub-comissão presidida pelo deputado
federal José de Filippi que trata do legado 2014. Discute-se a infraestrutura
para práticas esportivas, os equipamentos que servirão às competições,
alojamentos, coisas que permanecerão depois dos torneios. É preciso discutir
também a dimensão imaterial desse legado como por exemplo a melhoria dos ambientes
urbanos e ambientais, a inserção social e a criação de oportunidades, o
aproveitamento desses investimentos na melhoria da qualidade de vida do povo
brasileiro. Estou certo que a realização dos Jogos de 2016 tem, certamente, um
efeito transformador para a economia e para a história do Rio de Janeiro.
Guardadas as
devidas proporções, pensemos em Suzano. O legado deixado pelo governo Marcelo
Candido pode ser analisado em duas dimensões. Na dimensão estrutural podemos
listar o Hospital Regional de Suzano, cuja maquete apresentada e as iniciativas
para desapropriação do terreno são demonstrações claras do esforço
administrativo e da vontade política do governo atual em realiza-lo, para não
dizer o apoio do então Presidente Lula e o compromisso do ministro da saúde. O Instituto
Federal de Tecnologia - IFESP, a UNIPIAGET, a iluminação pública na cidade
inteira, o crescimento de 35% para 70% das ruas com pavimentação asfáltica, a
unidade 2 da Santa Casa, o Centro de Especialidades, o Centro de Especialidades
Odontológicas, as unidades de saúde, escolas, creches, equipamentos de cultura
e por aí vai... Às minhas visitas apresento o restaurante popular, a praça
Cidade das Flores e a feira noturna.
Quanto à
dimensão imaterial, a queda gradativa do índice de mortalidade infantil em
Suzano atingindo em 2010 o menor índice da história. É possível apresentar uma
lista interminável de melhorias, mas quero destacar minhas predileções. O
projeto Dança e Saúde, o Memória Viva, o Estúdio Público e o projeto Arte Pública.
Esse último é para mim, a cereja no bolo das excelentes políticas públicas de
cultura oferecidas desde 2005. Circular pela cidade e vê-la ganhando cores, contemplar
as cerejeiras em flor na Praça Cidade das Flores, encontrar figuras importantes
da nossa cultura popular desenhadas por aí torna os lugares mais alegres e nossa
cidade mais bonita. Além de uma contribuição estética, humaniza a cidade,
torna-a mais acolhedora, democratiza o acesso do povo à arte.
Precisaria de muitas linhas e vários artigos para listar
o legado estrutural, ético e estético do atual governo para esta cidade. Não é
o caso. Todavia, essa rápida reflexão nos leva à conclusão irrefutável que o
legado deixado por Marcelo Candido para Suzano é extraordinário. A continuidade
dessas políticas transformarão nossa cidade num museu a céu aberto.
Dada a crise generalizada que vivemos atualmente, toda e qualquer educação deve incluir o cuidado para com tudo o que existe e vive. Sem o cuidado, não garantiremos uma sustentabilidade que permita o planeta manter sua vitalidade, os ecossistemas, seu equilíbrio e a nossa civilização, seu futuro. Somos educados para o pensamento crítico e criativo, visando uma profissão e um bom nivel de vida, mas nos olvidamos de educar para a responsabilidade e o cuidado para com o futuro comum da Terra e da Humanidade. Uma educação que não incluir o cuidado se mostra alienada e até irresponsável. Os analistas mais sérios da pegada ecológica da Terra nos advertem que se não cuidarmos, podemos conhecer catástrofes piores do que aquelas vividas em 2011 no Brasil e no Japão. Para se garantir, a Terra poderá, talvez, ter que reduzir sua biosfera, eliminando espécies e milhões de seres humanos. Entre tantas excelências, próprias do conceito do cuidado, quero enfatizar duas que interessam à nova educação: a integração do globo terrestre em nosso imaginário cotidiano e o encantamento pelo mistério da existência. Quando contemplamos o planeta Terra a partir do espaço exterior, surge em nós um sentimento de reverência diante de nossa única Casa Comum. Somos insepráveis da Terra, formamos um todo com ela. Sentimos que devemos amá-la e cuidá-la para que nos possa oferecer tudo o que precisamos para continuar a viver. A segunda excelência do cuidado como atitude ética e forma de amor é o encantamento que irrompe em nós pela emergência mais espetacular e bela que jamais existiu no mundo que é o milagre, melhor, o mistério da existência de cada pessoa humana individual. Os sistemas, as instituições, as ciências, as técnicas e as escolas não possuem o que cada pessoa humana possui: consciência, amorosidade, cuidado, criatividade, solidariedade, compaixão e sentimento de pertença a um Todo maior que nos sustenta e anima, realidades que constituem o nosso Profundo. Seguramente não somos o centro do universo. Mas somos aqueles seres, portadores de consciência e de inteligência. pelos quais o próprio Universo se pensa, se conscientiza e se vê a si mesmo em sua esplêndida complexidade e beleza. Somos o universo e a Terra que chegaram a sentir, a pensar, a amar e a venerar. Essa é nossa dignidade que deve ser interiorizada e que deve imbuir cada pessoa da nova era planetária. Devemos nos sentir orgulhosos de poder desempenhar essa missão para a Terra e para todo o universo. Somente cumprimos com esta missão se cuidarmos de nós mesmos, dos outros e de cada ser que aqui habita. Talvez poucos expressaram melhor estes nobres sentimentos do que o exímio músico e também poeta Pablo Casals. Num discurso na ONU nos idos dos anos 80 dirigia-se à Assembléia Geral pensando nas crianças como o futuro da nova humanidade. Essa mensagem vale também para todos nós, os adultos. Dizia ele: A criança precisa saber que ela própria é um milagre, saber, que desde o início do mundo, jamais houve uma criança igual a ela e que, em todo o futuro, jamais aparecerá outra criança como ela. Cada criança é algo único, do início ao final dos tempos. E assim a criança assume uma responsabilidade ao confessar: é verdade, sou um milagre. Sou um milagre do mesmo modo que uma árvore é um milagre. E sendo um milagre, poderia eu fazer o mal? Não. Pois sou um milagre. Posso dizer Deus ou a Natureza, ou Deus-Natureza. Pouco importa. O que importa é que eu sou um milagre feito por Deus e feito pela Natureza. Poderia eu matar alguém? Não. Não posso. Ou então, um outro ser humano que também é um milagre como eu, poderia ele me matar? Acredito que o que estou dizendo às crianças, pode ajudar a fazer surgir um outro modo de pensar o mundo e a vida. O mundo de hoje é mau; sim, é um mundo mau. E o mundo é mau porque não falamos assim às crianças do jeito que estou falando agora e do jeito que elas precisam que lhes falemos. Então o mundo não terá mais razões para ser mau. Aqui se revela grande realismo: cada realidade, especialmente, a humana é única e preciosa mas, ao mesmo tempo, vivemos num mundo conflitivo, contraditório e com aspectos terrificantes. Mesmo assim, há que se confiar na força da semente. Ela é cheia de vida. Cada criança que nasce é uma semente de um mundo que pode ser melhor. Por isso, vale ter esperança. Um paciente de um hospital psiquiátricoque visitei, escreveu, em pirografia, numa tabuleta que ma deu de presente:”Sempre que nasce uma criança é sinal de que Deus ainda acredita no ser humano”. Nada mais é necessário dizer, pois nestas palavras se encerra todo o sentido de nossa esperança face aos males e às tragédias deste mundo.
Leonardo Boff é autor de “Cuidar da Terra-proteger a vida”, Record, Rio de Janeiro 2010.
Tenho 83 anos, sou professora aposentada, nascida e residente em Rio Claro. Nunca tive inimigos, só conquistei amigos. Dediquei30 anos de minha vida, a princípio na zona rural e, mais tarde, na cidade, alfabetizando, educando, formando e informando crianças a partir dos sete anos de idade. Sentia por elas um amor semelhante ao que sentia por minhas filhas, deixadas em casa aos cuidados de meus pais.
Sempre acreditei que as leis existem para a grandeza das nações, a paz entre os povos e a felicidade das pessoas. Vivi à sombra do mandamento maior: “Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos”. Ensinei que nos casos de perigo, medo,os alunos deveriam procurar auxílio dos adultos, principalmente daqueles que foram preparados para isso: os seguranças, os guardas, os policiais. Entretanto, hoje estou em dúvida: estaria enganada?
Eu e meu marido (também octogenário, professor e advogado aposentado) freqüentamos Cachoeira de Emas, pertencente ao município de Pirassununga, escolhida para momentos de lazer com amigos e familiares.
Voltávamos de lá, no fatídico 22 de julho de 2011, por volta de 14h30. Não sei precisar exatamente o local na rodovia SP-201, mas próximo a um riacho entre Emas e Pirassununga, quando um guarda rodoviário nos parou pedindo os documentos do carro, o que é seu dever.
Infelizmente o nosso motorista, esposo de uma de minhas filhas (ambos nos acompanhavam na viagem) havia se esquecido dos documentos. Cumprindo o seu dever, já lavrada multa, o policial nos informou que, devido à falta da documentação, o carro seria guinchado imediatamente. Diante de nosso apelo para que não ficássemos sem o carro, ele consultou seu superior. A resposta, como não poderia deixar de ser, foi negativa.
Descendo do carro, ficou à espera do guincho. Nós, de um lado da estrada, ele do outro, chegando a atravessá-la para nos vigiar. Senti-me como na época do nazismo, observando o próprio Hitler, tal a expressão de sua face.
Telefonamos para Rio Claro, mas, no meio da tarde nossos familiares estavam no ocupados com seus afazeres.
Cansada, gritei-lhe (ele permanecia ainda do outro da pista) se havia um banco no qual pudesse me sentar, não obtendo resposta.
Quando o guincho chegou, fomos forçados a sair do carro. Então, cumprido o seu papel, o senhor policial retirou-se, deixando-nos sós à beira da estrada.
Absolutamente constrangedor... eu de bengala, pois tenho problemas no joelho, nossos pertences espalhados pelo chão à beira da rodovia! uma visão tão estranha que ninguém nos ofereceu carona!
Eu permanecia sentada à beira do caminho, recebendo “chuva de poeira”. O céu nublando... sem contar o perigo, carros e caminhões carregados passando em alta velocidade. Para mim foi deprimente demais!
Meu marido, que também tem problemas de saúde, não conseguia ficar em pé. Não tínhamos condições nenhuma, sequer para satisfazer as necessidades mais elementares. Foram mais de duas horas de medo e aflição, até a chegada de um dos netos.
Agora me pergunto: para que serve o estatuto do idoso se até a polícia rodoviária, criada para a segurança de motoristas e passageiros nas estradas, paga com a renda de nossos impostos, transforma-se em vilão, provocando o medo e a insegurança?Por que esse militar foi tão cruel, maculando a imagem de toda uma corporação que presta serviços à sociedade?
Poucos anos me restam de vida; não guardo nenhum rancor, mas essa horrível ocorrência nunca mais sairá da minha memória. Este cidadão será contemplado em minhas orações, para que Deus transforme o seu coração de pedra.
Maria Witzel Jordão A autora é professora aposentada, escoteira, bandeirante, membro atuante da comunidade católica de Rio Claro.
Assim começa a canção Lara de Martinho da Vila e Zé Catimba. Quando pega no cavaco / sai divina criação / vai brotando na garganta / o que vem do coração. Criou tanta obra-prima / pra se cantar com prazer / o Império, a Serrinha / e o canto do tiê. Tiê, canta pra Ivone.
Uma das homenagens à dama do samba aconteceu no Centro Cultural da Juventude da Vila Nova Cachoeirinha, zona Norte de São Paulo. No esforço de preservação das raízes culturais afro-brasileiras, o anfitrião Moisés da Rocha, produtor cultural, pesquisador e apresentador do excelente programa O Samba Pede Passagem na rádio USP FM (93,7), chamou ao palco Fabiana Cozza que cantou para receber Ivone. Em conversa com Moisés, a constatação de que Suzano é exemplo na gestão de políticas públicas na área da cultura, e as justas referências ao prefeito Marcelo Candido e ao secretário de Cultura Walmir Pinto, lembrança dos sambistas da região como Rabicho e Xavier, e o setorial de cultura vinculado ao mandato do deputado estadual José Candido.
Yvonne Lara da Costa, ou Dona Ivone Lara, é carioca nascida em 13 de abril de 1921. Formada em enfermagem com especialização em terapia ocupacional, foi assistente social, trabalhou em hospitais psiquiátricos. Criada pelos tios, conheceu o samba e aprendeu a tocar cavaquinho. Foi aluna de Lucília Villa-Lobos e recebeu elogios do maestro Villa-Lobos. Casou-se com Oscar Costa, filho do presidente da escola de samba Prazer da Serrinha. Com a fundação do Império Serrano em 1947, passou a desfilar na ala das baianas. Compondo, tornou-se a primeira mulher a fazer parte da ala dos compositores de escola de samba. A aposentadoria em 1977 permitiu dedicação total à carreira artística.
Aposto que você conhece: Sonho meu, sonho meu / vai buscar quem mora longe, sonho meu... E essa então? Foram me chamar / Eu estou aqui, o que é que há / Eu vim de lá, eu vim de lá pequenininho / Mas eu vim de lá pequenininho / Alguém me avisou pra pisar nesse chão devagarinho... Ou ainda: Um sorriso negro, um abraço negro / traz felicidade...
Mas quem disse que eu te esqueço, Acreditar, Enredo do meu samba ou Tendência são canções obrigatórias em toda roda de samba que se preze. A propósito, o Império Serrano irá pra avenida em 2012 com Dona Ivone Lara: O enredo do meu samba.
Ivone Canta. Na garganta de Ivone Lara, emoções e o coração se transformam em palavras. Aos 90 anos de idade e esbanjando vitalidade, a dama estava no palco. É de se perguntar quantas vezes isso aconteceu nesses 60 anos de carreira. Mesmo ela deve ter perdido a conta. Sentada ou em pé, regendo a platéia ou puxando as canções e os sambistas, com o carinho de Bruno Castro, seu neto, seu anjo e seu banjo. A voz trêmula demonstra os sinais do cansaço, mas a beleza, o talento e a simpatia, o amor que devota ao samba convocam à celebração da vida, irradiam alegria e felicidade. Ivone encanta.
A segunda estrofe da canção do Martinho (que está no bom CD Lambendo a Cria) diz assim: Com a luz da poesia / maravilhosas canções / uma fonte de emoções / samba, tá ginga, tá na mente / ela é o chão e a semente. É importante dizer / com certeza, faço parte desses que amam você Dona Ivone. Lara, Lara, Lara... Ivone.
Estudante de Ciência Política na Universidade de Birmingham.
Ele é natural de Campinas, estudou na UNESP de Rio Claro.
Pesquisa inovações democráticas brasileiras.
Esteve em Rio Claro durante o ano de 2010 pesquisando o Orçamento Participativo.
Mora em Londres/Inglaterra.
Veja nosso diálogo sobre os incidentes, conflitos e/ou manifestações na Inglaterra.
Diego Scardone
Tudo iniciou com a morte de uma pessoa pela policia. A comunidade local se revoltou, porém grupos de jovens começaram a atacar prédios com fogo e saquear lojas. Os resultados da exclusão social aqui de Londres e outras cidades grandes da Inglaterra. São comunidades excluídas, e o estado não as alcança. Elas crescem num meio extremamente diferente do que eles próprios veem pela TV, ou pelo resto da cidade. Enfim, algo que aprendi com a minha experiência do orçamento participativo ai, principalmente em Várzea Paulista (Diego visitou Várzea Paulista, Suzano, Guarulhos, Rio Claro, e no estado de Minas Gerais visitou Pouso Alegre como objeto de sua pesquisa sobre democracia). É que estes problemas devem ser confrontados pela população local e não apenas pelos burocratas de Westminster.
Ivan Rubens São ingleses? são migrantes? grupos organizados? quem são esses grupos?
Diego Scardone São ingleses, em grande parte negros. São grupos organizados e não organizados (que se juntam através de facebook, internet, telefone móvel e outros social networks).
Ivan Rubens Organizados em torno de partidos, associações, entidades? tem algum ideário, algum perfil ideológico ou são movimentos autônomos.
Diego Scardone A mídia diz que são gangues. Mas não acredito. Quero ver isso apurado de forma clara. Tem muita especulação no momento. Então, até o momento dizem que são grupos de jovens normalmente em áreas pobres das cidades. Não existe nenhuma evidência de que seja algo organizado. Eu acredito que seja um fenômeno resultante da crise financeira que estamos passando, mas com mais ênfase nos cortes a gastos e serviços públicos. O governo cortou o EMI, uma política de transferência de renda para crianças pobres que atendem a escola depois dos 16 anos. Não é obrigatório depois desta idade. Cortes nos recursos de universidades, desemprego alto. E tem ainda o fenômeno da sociedade de consumo em que vivemos. Bombardeando a todos com propagandas de como devem se vestir, como devem se comportar, como devem ser. Mas como não têm dinheiro para comprar essas coisas partem para a força. E através das redes sociais passam a mensagem para o pais td. O que mais me provoca é a classe média e a mídia Britânica, como eles mostram a notícia, colocando uma parte da população contra a outra. Isso é a substituição da guerra contra o terror (com o medo vindo de fora) pela guerra do terror interno, com o medo vindo de dentro. Tudo que o governo atual precisa para intensificar a legislação contra as liberdades civis.
Ivan Rubens Qual a relação disso com a crise entre o magnata da mídia britânica e o primeiro ministro inglês? e as crises provocadas na imprensa sensacionalista?
Diego Scardone Policiais de alto escalão se despediram da policia. Jornalistas foram presos, e políticos investigados. Num pais que já sofre com denúncias de complacência no envio de presos políticos para serem torturados no Egito. Cortes públicos que atingiram os mais pobres traves de planos ‘the austeridade’, escândalos de apropriação indevida de despesas por políticos. Mas vamos pressionar o governo para implementar ‘regulations’ para a mídia daqui. Quem sabe outros países não seguem o mesmo exemplo?
Ivan Rubens os conflitos chegaram a Birmingham. Como está a rotina na cidade? houve fechamento de serviços públicos destinados a população de baixa renda?
Diego Scardone Está tudo bem. Em Birmingham foi mais interessante, pois os conflitos chegaram ao centro. A discrepância entra ricos e pobres em Birmingham é alarmante. Sempre participo das manifestações aqui. Não participei deste conflito pois não acredito que esta seja a melhor forma de manifestação.
MERITOCRACIA NA EDUCAÇÃO E SUCATEAMENTO DO SERVIÇO PÚBLICO
Crianças não receberão mais os incentivos se continuarem na escola depois dos 16. A política conservadora agora é de privilegiar as escola que vão bem em detrimento das que vão mal (a política do ‘Labour’ era o contrário). Tentaram mexer no serviço público de saúde para "aumentar a competição". Mas não conseguiram pois é o maior orgulho deste pais. Tentaram vender as florestas e parques mas a classe média disse: não. Privatizaram todas as universidades do pais. Cortaram benefícios e welfare para a população, e cortaram empregos no setor público e QUANGOS (organizações que prestam serviços a pequenos negócios e também em outras áreas da população como apoio ao turismo local e tal. Aparentemente fecharam alguns centros juvenis.
Ivan Rubens É possível comparar essa reação violenta da juventude na Inglaterra com as manifestações nas praças da Espanha? na linha do movimento de multidão?
Diego Scardone Não. Infelizmente não. O norte da Europa não esta em crise como o Sul. A crise foi forte entre 2007-8 e 2010, mas a situação está melhor. Vamos ver o que acontecerá nos próximos dias. Enquanto a classe média Britânica não sentir no bolso o que está havendo, eles não vão se rebelar. Sugiro a leitura do material do Breno Altman. O conheci aqui em Londres, gosto bastante da linha jornalística dele.
http://operamundi.uol.com.br/index.php
Ele tem um projeto muito interessante de jornalismo internacional, com um twist mais crítico o Brasil esta muito suscetível a BBC e outros meios de comunicação que não são sempre "imparciais".
Ivan Rubens o que vc acha que vai acontecer no curto e no médio prazo?
Diego Scardone Em relação aos eventos dos últimos dias aqui em Londres? Nós temos que fazer esta pergunta a comunidade local que foi afetada por estes problemas. Na minha opinião, o governo Conservador vai utilizar este evento como uma “oportunidade” para endurecer as regras relativas a “etiqueta de protestos”, e também começar uma vigilância mais robusta a social networks (às redes sociais). Londres é a cidade mais vigiada do planeta, e mesmo com todas estas câmeras nada foi “evitado”. Eles vão investir agora numa tecnologia de vigilância que pretende “prevenir” o crime e não somente trazer “criminosos” a justiça após o crime ser cometido. Se a saúde da economia não piorar, eu acho que as coisas vão voltar a normalidade. Será interessante assistir a reação da população quando os detalhes da morte do Mark Duggan vier à tona. Na semana passada qdo ele foi morto, um jornal transformou o policial que o matou em herói dizendo que ele “foi salvo pelo rádio do carro q “segurou” a bala que o mataria. Agora, as investigações demonstram que esta bala encontrada no radio veio da arma do policial. E agora o policial afirma que em momento algum ele afirmou que Duggan tentou atirar nele. Isso traz lembranças quanto a morte do Jean Charles aqui em Londres. Quando Jean Charles foi morto disseram que ele correu da policia e que ele estava usando uma jacket que era muito suspeita (poderia conter explosivos). Depois de “muita” investigação, congluíram que ele não correu da policia. Se somarmos tudo isso com o escândalo dos grampos telefônicos, onde “cabeças” da Scotland Yard renunciaram seus cargos antes da bomba explodir nas mãos deles (pois eles sabiam dos grampos), a moral da policia deveria estar baixa no momento. Mas é o oposto, a fama da policia esta altíssima pois eles “salvaram Londres e arriscaram as suas vidas nas últimas horas “para “proteger” a população dos bairros afetados. Enfim, a população está muito suscetível ao que a midia diz. Além deste caso, tivemos um outro cidadão que foi morto durante os protestos do G20 em 2009. Enfim, não acredito que tenha uma conexão com os protestos do sul da Europa. Agora, se esta crise financeira atingir a Franca, a Alemanha e a Inglaterra... ai veremos a Europa pegar fogo.
Ivan Rubens A policia inglesa tem reagido violentamente com quem usa roupas supostamente 'suspeitas'.
Diego Scardone Sugeri uns vídeos que estão no youtube. (consulte os vídos em luisclaudiopt.blogspot.com) Esta parece ser uma questão de Multiculturalismo. Em 2009 se não me engano a Angela Merkel disse que multiculturalismo falhou na Alemanha. Em 2010, vem o Cameron dizendo o mesmo. Você tem todas as leis estabelecidas na França contra artigos religiosos que são visíveis (portando uma política heterogênea onde tds parecem iguais, então espera que a violência diminua). O parlamento italiano está votando nessa semana medidas parecidas às da França. A policia melhorou muito aqui mas ainda deve existir preconceito. Durante a guerra contra o terror, a maioria das pessoas paradas pela policia era de aparência árabe por exemplo. Mas essas são questões mais difíceis de lidar. O governo usa a chamado "Segurança Nacional" para lidar com estes problemas. A segurança nacional que entrou no lugar da SEGURANCA SOCIAL com todas a carga trazida pelas reformas neoliberais. Diante de todas essas transformações, como será que um país imagina a si próprio? Como a imagem do "outro" do "diferente" é estabelecida? A policia tem uma instituição poderosa em suas costas e pode fazer uso desta para atingir os seus objetivos. Muitas pessoas estão atacando os chamados "chavs" nas redes sociais. "Chavs" no Brasil nós os chamaríamos de "bregas"? não sei, mas não ficarei surpreso se a policia esteja parando tds q se vistam desta forma hj pela capital.
Mais tarde...
Diego Scardone Interessante como as coisas estão evoluindo aqui. Esta se alastrando pelo país todo. Então, várias cidades reportando problemas. Interessante q a mídia não está mostrando muita coisa. Escutei helicópteros e sirenes o dia td. Mas a mídia só repete o q já foi dito. Não acho que está acontecendo a revolta que ambos gostaríamos que fosse. Mas também o que a mídia fala pode não ser verdade. Não ficarei surpreso se o que estiver acontecendo esteja sendo manipulado pela mídia para que pareça algo negativo. Todo o medo que colocam nas pessoas, enfim.
Ivan Rubens Sem julgamentos. Estou certo de que existem razões, motivações. Algumas legítimas e outras não. Aposto que são impactos, de alguma forma, das políticas.
Diego Scardone sim... de ideologias eu acho....
Ivan Rubens Tem gente também que está aproveitando a situação. Mas as políticas de estado, as ideologias que se traduzem Tb nas políticas de Estado, e fundamentalmente os reflexos da crise do paradigma capitalista. Vc falou do estímulo ao consumo, do avanço desenfreado das fronteiras do mercado mundial e suas conseqüências. Jovens são bombardeados o tempo todo com anúncios, propagandas que falam dum mundo que existe mas não pertence a eles.
Diego Scardone sim. Temo que a mídia esteja mostrando o q esta mostrando para deixar o povo com medo. Talvez esse fosse uma oportunidade para tds irem as ruas e protestar qto as políticas de austeridade. O medo colocado nas pessoas os prende em casa, paralisa. Tvz sejam "as massas" lá fora, mas a TV filtra o q quer mostrar. Mostra apenas os saques e não o propósito de destruir o símbolo do capital (bancos e outras corporações).
Outros comentários do Diego
Fico meio triste por ver esta juventude meio que se perdendo. Penso muito no Brasil e nos problemas que temos ai: Exclusão social, consumismo e o bombardeio midiático dizendo a toda hora como "devemos ser/ o que devemos ter". A destruição de prédios e os saques em lojas obviamente são irresponsáveis, mas acho fraco focarmos todo nosso senso crítico na punição dos responsáveis e não nas causas.
participaram desta conversa ainda, Luis Cláudio Messa Longo, Jaime Cabral e Antonio Morgado. outras informações e vídeos disponíveis em luisclaudiopt.blogspot.com
Sábado choroso, perfeito pra leitura, cinema, namoro. Na mais paulista das avenidas, passearam. Circularam pelas transversais, interagiram com instalações, observaram pessoas, comportamentos. Contemplaram o MASP - Museu de Arte de São Paulo e o Parque Trianon – Parque Tenente Siqueira Campos. Observaram o frenesim de todo tipo de gentes, de casais. Amaram, se beijaram, circularam. Mais um belo e estranho dia para se ter alegria.
Ouviram trechos de canções na FNAC, fragmentos de literatura e recomposição das forças no conforto relativo dos sofás e pufes da Livraria Cultura. Um café para outra conversa e a caminhada segue. Sob a garoa num clima de romance, meia noite em Paris numa das salas do espaço Unibanco da rua Augusta. Dirigido por Woody Allen, a comédia romântica é ambientada em Paris. A canção Let’s do it (let’s fall in love) de Cole Porter, de 1928, um bem-humorado convite à vida instintiva, deixa o romance convidativo. A versão Façamos (vamos amar), de Carlos Rennó interpretada por Chico Buarque e Elza Soares fala da universalidade do amor.
Caminharam novamente pela noite paulistana sem destino. O durante era mais saboroso. Na estação da Luz uma cena chamou a atenção de ambos. Três moças caminhavam e, ao redor delas, muitos meninos tentando interagir com pouca gentileza. Tática nada exitosa.
No trem, lugares ocupados, algumas pessoas em pé. Um pastor pregando compulsivamente. As três moças sentadas lado a lado. Um rapaz aparentando 30 anos, em pé de frente para uma delas. Segue viagem. De súbito, um salto, um grito. A jovem com sapatos de salto alto, tentando recuperar o fôlego, acusa o rapaz de tê-la atentado o pudor. O pastor pregando. O rapaz mudo. A moça aos berros. Atônitos, passageiros buscando compreensão.
Recuperada do susto inicial, a moça reafirma suas acusações. Revoltadas com a obscenidade e tamanha violência, as amigas ajudaram a vítima a raciocinar: o que nós vamos fazer com esse safado?
O pastor pregando. Passageiros/as tomando partido até o momento em que escutaram do acusado: “foi sem querer”. Aquele júri popular decretara a sentença e nenhuma dúvida mais pairava naquele vagão: trata-se de um tarado. Revolta geral. A pequena multidão enfurecida, situação fora de controle, vias de fato. De sapato em punho, a vítima desferia golpes contra o rapaz. O salto agulha zumbia. O pastor pregava.
Portas abertas, a equipe de segurança da estação agiu entre sopapos e bofetões. Dizem que o procedimento padrão é averiguar na delegacia de polícia. Quem permaneceu no vagão, seguindo viagem, ânimos se acalmando. Nesse ínterim, a revolta migrava ao pastor que, pregando, percebeu e tratou de descer apressado. O casal do início da história nunca imaginou um sábado choroso iniciado com cultura, passando pelo romance e terminando no crime.
Nesse universo, temas como cultura, lazer, trânsito e transporte, comportamento, violência e outros, estão em debate na Conferência de Políticas para Mulheres e na Conferência de Políticas para Juventude.
O ato terrorista perpetrado na Noruega de forma calculada por um solitário extremista norueguês de 32 anos, trouxe novamente à baila a questão do fundamentalismo. Os governos ocidentais e a mídia induziram a opinião pública mundial a associar o fundamentalismo e o terrorismo quase que exclusivamente a setores radicais do Islamismo. Barack Obama dos USA e David Cameron do Reino Unido se apressaram em solidarizar-se com governo da Noruega e reforçaram a idéia de dar batalha mortal ao terrorismo, no pressuposto de que seria um ato da Al Qaeda. Preconceito. Desta vez era um nativo, branco, de olhos azuis, com nivel superior e cristão, embora o The New York Times o apresente “sem qualidades e fácil de se esquecer”. Além de rejeitar decididamente o terrorismo e o fundamentalismo devemos procurar entender o porquê deste fenômeno. Já abordei algumas vezes nesta coluna tal tema que resultou num livro “Fundamentalismo, Terrorismo, Religião e Paz: desafio do século XXI”(Vozes 2009). Ai refiro, entre outras causas, o tipo de globalização que predominou desde o seu início, uma globalização fundamentalmente da economia, dos mercados e das finanças. Edgar Morin a chama de “a idade de ferro da globalização”. Não se seguiu, como a realidade pedia, uma globalização política (uma governança global dos povos), uma globalização ética e educacional. Explico-me: com a globalização inauguramos uma fase nova da história do Planeta vivo e da própria humanidade. Estamos deixando para trás os limites restritos das culturas regionais com suas identidades e a figura do estado-nação para entrarmos cada vez mais no processo de uma história coletiva, da espécie humana, com um destino comum, ligado ao destino da vida e, de certa forma, da própria Terra. Os povos se puseram em movimento, as comunicações universalisaram os contactos e multidões, por distintas razões, começam a circular pelo mundo afora. A transição do local para o global não foi preparada, pois o que vigorava era o confronto entre duas formas de organizar a sociedade: o socialismo estatal da União Soviética e o capitalismo liberal do Ocidente. Todos deviam alinhar-se a uma destas alternativas. Com o desmonte da União Soviética, não surgiu um mundo multipolar mas o predomínio dos EUA como a maior potência econômico-militar que começou a exercer um poder imperial, fazendo que todos se alinhassem a seus interesses globais. Mais que globalização em sentido amplo, ocorreu uma espécie de ocidentalização mundo e, em sua forma pejorativa,uma hamburguerização. Funcionou como um rolo compressor, passando por cima de respeitáveis tradições culturais. Isso foi agravado pela típica arrogância do Ocidente de se sentir portador da melhor cultura, da melhor ciência, da melhor religião, da melhor forma de produzir e de governar. Essa uniformização global gerou forte resistência, amargura e raiva em muitos povos. Assistiam a erosão de sua identidade e de seus costumes. Em situações assim surgem, normalmente, forças identitárias que se aliam a setores conservadores das religiões, guardiães naturais das tradições. Dai se origina o fundamentalismo que se caracteriza por conferir valor absoluto ao seu ponto de vista. Quem afirma de forma absoluta sua identidade, está condenado a ser intolerante para com os diferentes, a desprezá-los e, no limite, a eliminá-los. Este fenômeno é recorrente em todo o mundo. No Ocidente grupos significativos de viés conservador se sentem ameaçados em sua identidade pela penetração de culturas não-européias, especialmente do Islamismo. Rejeitam o multiculturalismo e cultivam a xenofobia. O terrorista norueguês estava convencido de que a luta democrática contra a ameaça de estrangeiros na Europa estava perdida. Partiu então para uma solução desesperada: colocar um gesto simbólico de eliminação de “traidores” multiculturalistas. A resposta do Governo e do povo norueguês foi sábia: responderam com flores e com a afirmação de mais democracia, vale dizer, mais convivência com as diferenças, mais tolerância, mais hospitalidade e mais solidariedade. Esse é o caminho que garante uma globalização humana, na qual será mais difícil a repetição de semelhantes tragédias.
A frase de Einstein goza de plena atualidade: “o pensamento que criou a crise não pode ser o mesmo que vai superá-la”. É tarde demais para fazer só reformas. Estas não mudam o pensamento. Precisamos partir de outro, fundado em princípios e valores que possam sustentar um novo ensaio civilizatório. Ou então temos que aceitar um caminho que nos leva a um precipício. Os dinossauros já o percorreram. Meu sentimento do mundo me diz que quatro princípios e quatro virtudes serão capazes de garantir um futuro bom para a Terra e à vida. Aqui apenas os enuncio sem poder aprofundá-los, coisa que fiz em várias publicações nos últimos anos. O primeiro é o cuidado. É uma relação de não agressão e de amor à Terra e a qualquer outro ser. O cuidado se opõe à dominação que caracterizou o velho paradigma. O cuidado regenera as feridas passadas e evita as futuras. Ele retarda a força irrefreável da entropia e permite que tudo possa viver e perdurar mais. Para os orientais o equivalente ao cuidado é a compaixão; por ela nunca se deixa o outro que sofre abandonado, mas se caminha, se solidariza e se alegra com ele. O segundo é o respeito. Cada ser possui um valor intrínseco, independetemente de seu uso humano. Expressa alguma potencialidade do universo, tem algo a nos revelar e merece exisitir e viver. O respeito reconhece e acolhe o outro como outro e se propõe a conviver pacificamente com ele. Ético é respeitar ilimitadamene tudo o que existe e vive. O terceiro é a responsabilidade universal. Por ela, o ser humano e a sociedade se dão conta das consequências benéficas ou funestas de suas ações. Ambos precisam cuidar da qualidade das relações com os outros e com a natureza para que não seja hostil mas amigável à vida. Com os meios de destruição já construidos, a humanidade pode, por falta de responsabilidade, se autoeliminar e danificar a biosfera. O quarto princípio é a cooperação incondicional. A lei universal da evolução não é a competição com a vitória do mais forte mas a interdependência de todos com todos. Todos cooperam entre si para coevoluir e para assegurar a biodiversidade. Foi pela cooperação de uns com os outros que nossos ancestrais se tornaram humanos. O mercado globalizado se rege pela mais rígida competição, sem espaço para a cooperação. Por isso, campeiam o individualismo e o egoismo que subjazem à crise atual e que impediram até agora qualquer consenso possível face às mudanças climáticas. Os quatro princípios devem vir acolitados por quatro virtudes, imprescindíveis para a consolidação da nova ordem. A primeira é a hospitalidade, virtude primacial, segundo Kant, para a república mundial. Todos tem o direito de serem acolhidos o que correspode ao dever de acolher os outros. Esta virtude será fundamental face ao fluxo dos povos e aos milhões de refugiados climáticos que surgirão nos próximos anos. Não deve haver, como há, extra-comunitários. A segunda é a convivência com os diferentes. A globalização do experimento homem não anula as diferenças culturais com as quais devemos aprender a conviver, a trocar, a nos complementar e a nos enriquecer com os intercâmbios mútuos. A terceira é a tolerância. Nem todos os valores e costumes culturais são convergentes e de fácil aceitação. Dai impõe-se a tolerância ativa de reconhecer o direito do outro de existir como diferente e garantir-lhe sua plena expressão. A quarta é a comensalidade. Todos os seres humanos devem ter acesso solidário e suficiente aos meios de vida e à seguridade alimentar. Devem poder sentir-se membros da mesma família que comem e bebem juntos. Mais que a nutrição necessária, trata-se de um rito de confraternização. Todos os esforços serão em balde se a Rio+20 de 2012 se limitar à discussão apenas de medidas práticas para mitigar o aquecimento global, sem discutir outros princípios e valores que podem gerar um consenso mínimo entre todos e assim conferir sustentabilidade à nossa civilização. Caso contrário, a crise continuará sua corrosão até se transformar num tragédia. Temos meios e ciência para isso. Só nos faltam vontade e amor à vida, à nossa, e a de nossos filhos e netos. Que o Espírito que preside à história, não nos falte. Leonardo Boff é autor de Saber cuidar: ética do humano-compaixão pela Terra, Vozes 1999.