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Todo seu querer

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No dia dos namorados encontrei uma bela canção. Trata-se de TODO SEU QUERER, interpretada por Mariene de Castro e Roberto Mendes. Pesquisando um pouco a respeito da canção, descobri tratar-se de uma composição dos baianos Roberto Mendes e José Carlos Capinan. Fazer música e fazer poesia é uma espécie de artesanato, músico e poeta são um tanto escultores. O poeta escolhe criteriosamente algumas palavras e vai esculpindo uma a uma, palavra por palavra, depois começa a juntar as palavras esculpidas, vai esculpindo as frases, linha por linha, vai esculpindo sua obra de arte. Com o músico imagino que seja parecido, escolhe sons, acordes, vai esculpindo, esculpindo, vai esculpindo cuidadosa e criteriosamente sua obra de arte.

No dia dos namorados uma bela canção me encontrou. Eu estava distraído quando a canção passou por mim produzindo um primeiro afeto quase imperceptível. Insistente, a canção se fez presença. Então pensei: “opa, aí tem coisa”. Ato contínuo, peguei o celular, abri o aplicativo e coloquei minha atenção tanto na letra quanto na melodia. A canção diz assim:

Quando o amor olha pra você querendo te prender nos braços de alguém / quando o amor fala pra você com palavras loucas todo o seu querer / E quando o amor tem sabor de fruta colhe em tua boca a manga madura / em tua mão em fogo acende o teu corpo tira a tua roupa procurando a flor.
Ai amor diga sorrindo / ai amor / seja bem vindo / ai amor / diga chorando, amor, você chegou / Ai amor diga que volta / ai amor / beijo de adeus quando se for.

Os afetos iniciais produzidos nesse lindo encontro canção e ouvinte me levaram pelo caminho de pensar numa declaração de amor. Uma pessoa dizendo palavras verdadeiras, belas e apaixonadas para uma outra pessoa. Desconfiado que uma obra de arte guarda belezas com força de produzir mais e mais beleza, lancei ainda mais atenção para a escultura. O que estaria escondendo nessa letra o poeta? e isso me levou a um segundo afeto.

O amor da canção não é um sentimento mas um personagem. É o amor que olha, é o amor que deseja, é o amor que fala com poucas palavras. Na obra, o amor tem sabor de fruta, o amor colhe, é o amor quem coloca fogo nas mãos e tocam um corpo que, em chamas, tira a roupa. Mas não tira a toa. Motivado pela força do amor, a mão procura uma flor. Uma flor. É muito bonito isso: a mão em chama de amor procurando a flor.

Então o poeta pede ao amor para dizer, o poeta pede ao amor para sorrir. O poeta dá as boas vindas ao amor e chora, certamente de alegria para celebrar a chegada do amor. Nós, ouvintes e admiradores da obra, nós que sentimos a beleza enchendo o peito com esperança na vida, nas belezas da vida e na maravilhosa oportunidade de viver, de respirar, nós que sentimos os raios de sol queimando a pele, nós que sentimos as gotas da chuva molhando a pele, o vento beijando o rosto, ainda seremos capazes de sentir a alegria e a leveza de não precisar carregar nada para poder sentir e pensar. Sentir e pensar, fechar os olhos e sentir a beleza atravessar e, atravessando, produzir novidades: novas formas de sentir e pensar.

E assim como vem, o amor vai. Então vá, que seja leve e que seja forte o suficiente para voltar. Para ir quando for o momento de ir e voltar quando for momento de voltar. Voltar modificado, voltar verdadeiro, voltar saboroso. Nas idas e vindas, vamos esculpindo o amor, vamos fazendo da vida uma obra de arte.

Ivan Rubens

Artesão de palavras





dedico ao artista José Celso Martinez Corrêa


publicado no Jornal Cidade de Rio Claro na edição de 11/julho/2023