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Toda menina baiana tem um santo, que Deus dá / Toda menina baiana tem encanto, que Deus dá / Toda menina baiana tem um jeito, que Deus dá / Toda menina baiana tem defeito também que Deus dá / Que Deus deu / Que Deus dá...
Segundo o compositor, essa canção nasceu em Salvador para a sua filha mais velha, Nara Gil. Nara estava entrando na adolescência, a primeira filha adolescente na vida do então casal Gilberto Gil e Belina de Aguiar. Na canção, Gil faz uns alertas para a primeira filha: fala do caráter fundador da Bahia, fala também das virtudes e defeitos do homem. Localizei a primeira gravação desta canção no álbum Realce de 1979 e, acredito que os comentários de Gil acerca da canção pertençam também a essa época.
Que Deus entendeu de dar a primazia / Pro bem, pro mal, primeira mão na Bahia / Primeira missa, primeiro índio abatido também / Que Deus deu
Nesta perspectiva, compreendemos que ele esteja se referindo à dimensão da humanidade de mulheres e homens: “Por força da busca de compreensão do divino no humano, eu me empenhava em me desvencilhar do maniqueísmo, abarcando as idéias ligadas tanto ao bem quanto ao mal, um tema básico de minhas canções: reiterar o sentido da tolerância, do perdão, da compreensão de que o homem é permeado pelo bem e pelo mal e de que a superação de um implica a superação do outro; você não se livra do mal sem se livrar do bem. A promessa das religiões reside nisso: na superação transcendental de ambos", disse Gilberto Gil a propósito dessa canção.
Que Deus entendeu de dar toda magia / Pro bem, pro mal, primeiro chão na Bahia / Primeiro carnaval, primeiro pelourinho também / Que Deus deu
Podemos pensar o maniqueísmo como um conflito entre o bem e o mal. Para livrar-se do mal é necessário livrar-se do bem, e vice-versa. Bem e mal são as duas faces de uma mesma moeda. Bem e mal são as duas cabeças de um mesmo dragão, duas cabeças cujo olhar está carregado de magia, uma certa magia com ares de sedução.
Que Deus deu / Que Deus dá
Salvador, capital da Bahia, é considerada a cidade mais negra fora do continente africano. Na canção, toda magia, o bem e o mal aparecem como primeiro chão, como a base, uma espécie de território de dor mas também de festa porque a vida também é feita dessas antíteses, dessas contradições. Talvez seja essa a obra que nasce dentro do corpo do artista que, atravessado pelas forças vivas do mundo, sai do corpo e rebenta. E nos coloca nesse lugar e neste tempo, novembro de 2021, celebrando uma África que se faz em nós.
Viva Zumbi, viva Antônio Conselheiro, viva Corisco, Lampião e Maria Bonita. Viva Gilberto Gil cujo corpo negro vestido de Ministro da Cultura levou a menina baiana (e a Bahia menina) e fez a festa no plenário das Nações Unidas.
Ivan Rubens
Estudante
Estudante
o show completo da Bahia menina no plenário da ONU pode ser visto em https://www.youtube.com/watch?v=l7PjqJLGq7w
texto publicado no Jornal Cidade de Rio Claro na edição de 02 de novembro de 2021.
Eu gostei, achei um bom texto
ResponderExcluirLindo o texto
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