Orçamento Participativo e a vida na cidade

Todos os 5.564 municípios brasileiros têm até o último dia de setembro para encaminhar às respectivas câmaras municipais a Lei do Orçamento Anual - LOA. A iniciativa da LOA compete privativamente ao poder executivo. A LOA estima receitas e fixa despesas para a execução orçamentária do ano seguinte. Trata-se de uma lei pela qual o Poder Legislativo (Câmara de Vereadores) autoriza o Poder Executivo (Prefeitura) a utilizar o dinheiro público, ou seja, o dinheiro do povo arrecadado com os tributos (impostos, taxas, contribuições e tarifas). O mesmo raciocínio serve para os 26 estados da Federação, para o Distrito Federal e para o Governo Federal.

Na dimensão do planejamento, o orçamento determina as prioridades do governo durante o ano. Na dimensão da democracia, o orçamento possibilita à sociedade conhecer e fazer pressão sobre a arrecadação e os gastos públicos. Garante transparência e dificulta a corrupção. Na dimensão política, o orçamento é um instrumento que permite à sociedade controlar o Poder Executivo. Afinal, informação é uma arma da sociedade. Alguns governos adotam a metodologia participativa na construção da LOA, criando canais de participação popular e de exercício da democracia direta, além de socializar as informações acerca do dinheiro público. Um estudo do Instituto Pólis demonstra que durante a gestão 2005-2008, dos 645 municípios paulistas, apenas 30 construíram a LOA na metodologia participativa.

Em Suzano, a gestão Marcelo Candido adotou o OP. Neste segundo ciclo, o processo continua muito rico. Nas últimas semanas, o CORPO (Conselho do OP) discutiu com as secretarias municipais de Educação, de Cultura, de Promoção da Cidadania e Inclusão Social. Das prioridades eleitas nas 12 plenárias regionais, os conselheiros receberam as informações das secretarias, conheceram os projetos construídos pelo governo, perceberam as possibilidades e os limites impostos pela legislação e pelo tensionamento das forças institucionais e das forças políticas, esclareceram dúvidas, contribuíram com sugestões e críticas, expressaram opiniões. Soma-se a esse esforço coletivo, produzido por 32 conselheiros e 32 suplentes - sendo 25% representantes do governo -, a sabedoria do Benedito, a disciplina da Cátia, a segurança do Vicente, a tranqüilidade do Márcio, a juventude do Allan e do Edvaldo, a garra da Néia e do Ademir, a força da Mairi e do Sérgio, a paciência do Paulo e da Rosani, a sensibilidade e a poesia da Valéria. Como diria a conselheira Cecília, “somos a tela e a tinta”, a expressão da dimensão humana, o encontro do saber popular com o técnico, na construção da cidade. Educadores populares na construção coletiva do conhecimento, da cidade, da democracia e da república.

No exercício do OP, o governo Marcelo Candido permite que a população se aproprie do orçamento, conheça os métodos de elaboração, das nomenclaturas, das fontes de informação, amplie os canais de diálogo e de informação visando ao controle social sobre a máquina pública. Quanto mais informado, menos enganado será o povo. Outro objetivo é reconhecer e valorizar o conhecimento popular e, no contato com o governo, aquecer a frieza dos planos, programas e projetos incorporando o calor da dimensão maravilhosa da vida real.

República, democracia e a cidade de Suzano

Ocorreu no dia 21 de julho o Seminário de Formação do Conselho do Orçamento Participativo (CORPO) de Suzano. Um sábado festivo, rico na troca de experiências, de conhecimentos e fundamental na construção de um grupo que tem a responsabilidade de definir, em nome dos milhares de suzanenses que participaram das plenárias do OP, o plano de investimentos para 2008. Licitações, funcionamento da administração pública, fluxos e procedimentos administrativos foram assuntos provocados pelo geógrafo Ivo Reseck. Governo municipal e população se fundindo e confundindo na riqueza e na intensidade das trocas, nos saberes complementares. Para os antigos gregos, democracia: demos (povo) kracia (governo).

Preparados, conselheiras e conselheiros avançaram nos debates com as secretarias municipais. Cabe ao CORPO estudar, detalhar, orçar, compreender as 36 prioridades eleitas durante o ciclo de plenárias, para que possa priorizar dentre as prioridades. Assim, nos quatro encontros que sucederam o Seminário, discutimos as prioridades relacionadas à saúde e às obras de infra-estrutura. Conselheiras e conselheiros dialogaram com as secretárias municipais Célia Bortoletto e Lúcia Montibeller. O saber técnico no encontro com o saber popular, a política como habilidade no trato das relações humanas com vistas à obtenção de resultados esperados: o impacto do investimento público numa região da cidade, a quem beneficiará esse investimento, se está havendo o respeito aos princípios norteadores da administração pública, se a escolha é coerente com os compromissos políticos (programa de governo eleito nas urnas), com as peças de planejamento (PPA e LDO) e, principalmente, com a capacidade de investimento da prefeitura municipal.

Na minha modesta opinião, outra compreensão de cidade e de sociedade à medida que a participação popular inverte as prioridades de investimento público e se constrói coletivamente a noção de responsabilidade com a coisa pública, com a res publica
(conceito romano).

As reuniões extrapolam as deliberações do OP. Prestar serviço de forma direta ou indireta, as concessões públicas, o real atendimento aos interesses da população ou aos interesses do capital, transporte coletivo e saneamento básico, o projeto SIM em tramitação na Câmara Municipal e a renovação do contrato com a Sabesp foram amplamente debatidos. E as diferenças aparecem naturalmente: 30 anos de silêncio foram importantes para o florescer da democracia em Suzano.

Por fim, a participação articula bastante bem democracia e república. O ideal republicano está dedicado à coisa comum ou coletiva. Essa participação nem sempre é politizada, mas é grande o seu potencial político, porque forma as pessoas para agirem sem esperar ordens de cima. O CORPO, voltando seu trabalho para o bem comum, é uma prática republicana. Somada a outras ações de democratização do Estado desencadeadas em Suzano pela gestão Marcelo Candido estamos acostumando as pessoas a agirem de baixo para cima, numa pedagogia democrática. Afinal, a educação para a democracia se faz na escola da vida, ou seja, na relação com o outro. Ou ainda, participando da vida social.