Um índio e um idiota


Na canção ‘Um Índio’, o baiano Caetano Veloso fala de dois mundos: o mundo dos indígenas e o mundo dos não indígenas, dos kubéns como diz o Cacique Raoní.


Um índio descerá de uma estrela colorida, brilhante / De uma estrela que virá numa velocidade estonteante / E pousará no coração do hemisfério sul / Na América, num claro instante / Depois de exterminada a última nação indígena / E o espírito dos pássaros das fontes de água límpida / Mais avançado que a mais avançada das mais avançadas das tecnologias / Virá...


Tendo os kubéns dominando a Natureza com avançadas tecnologias e completado seu projeto ‘civilizatório’, colonial e escravagista, comprometendo a biodiversidade, poluindo as águas, devastando a natureza e exterminando povos originários, chega um índio.


Impávido que nem Muhammad Ali / Virá que eu vi / Apaixonadamente como Peri / Virá que eu vi / Tranqüilo e infálivel como Bruce Lee / Virá que eu vi / O axé do afoxé Filhos de Gandhi / Virá...


Um índio singular: impávido e apaixonado, tranquilo e infalível, pacífico e dançarino. Ele é uma mistura de interessantes seres humanos como Muhammad Ali, Gandhi e Peri (personagem de José de Alencar em O Guarani).


Um índio preservado em pleno corpo físico / Em todo sólido, todo gás e todo líquido / Em átomos, palavras, alma, cor / Em gesto, em cheiro, em sombra, em luz, em som magnífico / Num ponto equidistante entre o Atlântico e o Pacífico / Do objeto-sim resplandecente descerá o índio / E as coisas que eu sei que ele dirá, fará / Não sei dizer assim de um modo explícito / Virá...


Raoní Metuktire é um índio, liderança da etnia Mebengokrê (Kayapó). Cacique Geral, tem levado a causa indígena para o mundo. Frequenta a ONU e o Vaticano, foi indicado para o nobel da paz 2019. Raoní reuniu recentemente o povo Mebengokrê e diversas lideranças indígenas visando a uma aliança de povos em defesa de suas terras, da floresta e da vida, contra a ganância dos kubéns. Durante muitos séculos a floresta foi habitada por milhões de indígenas até a chegada dos kubéns que colonizaram e exploram a América. Atualmente habitam apenas cerca de 13% do território brasileiro. E os setores da mineração e do agronegócio, em aliança com o Governo, avançam sobre as terras indígenas. Para os kubéns, 87% das terras nacionais não são suficientes, eles querem mais.


E aquilo que nesse momento se revelará aos povos / Surpreenderá a todos não por ser exótico / Mas pelo fato de poder ter sempre estado oculto / Quando terá sido o óbvio


“Cada vez mais o índio é um ser humano igual a nós”. De que humano estais falando, cara pálida? talvez algum torturador que a excelência cultua? porque cultuar a morte e a dor, agir com desrespeito e intolerância, estimular o ódio é desumanizar. Sim porque tira da vida o brilho, o gosto e a alegria. O messiânico capetão seria, então, um animal? Pensando bem, os animais não merecem nenhuma aproximação com este ser abominável. No dicionário etimológico, o indivíduo destituído de qualquer distinção, ignorante e de pouca inteligência é um idiota. Adequado.


Ivan Rubens

publicado no Jornal Cidade de Rio Claro em 27 de janeiro de 2020
27 de janeiro de 2020